terça-feira, 20 de maio de 2008

Homenagem ao Engº Francisco de Almeida e Sousa

Homenagem ao Engº Francisco de Almeida e Sousa

É com grande alegria, enorme respeito e muita emoção que cumpro esta tarefa rotária de apresentar o grande cidadão que hoje nos dá o privilégio de estar connosco, cidadão este que dá pelo nome de Engº Francisco de Almeida e Sousa.Saiba V.Exª, Sr. Engº, que os que aqui estamos somos só uma amostra de quantos gostariam de cá estar o que só razões de operacionalidade não permitiram.Há já muitos anos que as colunas do Jornal de Notícias me deram a conhecer V.Exª, Sr. Engº. E sei que, como eu, muitos outros o conhecem, já que a sua dedicação às causas justas ultrapassou os limites dos círculos pequenos. O respeito e a admiração pela sua personalidade não têm medida e, acreditem todos os presentes , o seu exemplo tem influenciado a minha própria postura na vida. A sua coluna semanal, desde há muitos anos, no Jornal de Notícias, dá-nos o retracto daquilo que todos devíamos ser e não conseguimos, mas que V.Exª. consegue, e é.Meus caros amigos:A relevância que hoje aqui damos a este insigne cidadão tem de merecer da nossa parte uma reflexão profunda. O que fazemos no Mundo? Que valores devem nortear a nossa fugaz passagem por esta vida terrena? Que medida temos para os princípios, aceites por todas as religiões e filosofias, de solidariedade, fraternidade, compreensão e paz? Que prática fazemos dos nossos ideais rotários de justiça, verdade, boa vontade e de bem que nos aponta a prova quádrupla?O Sr. Engº Almeida e Sousa tem-nos dado estas respostas não só com a teoria, nos seus artigos do JN, mas com a sua prática, quer seja no Barredo ou no Lar N. Sra. do Livramento, quer seja no combate político, na sua casa do Campo Alegre e em muitos outros lugares.É que o Sr. Engº Almeida e Sousa além de profissional de grande relevo, cujos dados biográficos o JN há dias divulgou, a ele se devendo uma parte significativa do desenvolvimento industrial do Norte, nomeadamente no sector da fundição e nos aproveitamentos hidro-eléctricos (A própria Associação Industrial Portuense não seria o que é hoje se não fosse o seu empenho), tem dedicado a sua vida a responder, e de que maneira, a todas estas questões. Abre a porta da sua casa a qualquer hora do dia ou da noite seja a quem for (os mais humildes sabem disso e passam palavra), junta-se em fraternidade aos excluídos (Que o digam os companheiros de Emaús na sua ceia de Natal na estação de S.Bento?), recolhe os deserdados e deserdadas da vida nas instituições por ele patrocinadas ou noutras a quem vai pedir ajuda, arranja livros para as suas crianças de forma a que não seja por falta deles que não possam estudar.Clama contra a desigualdade da gestão pública pelo poder político, não se cansando de mostrar os dados que provam que o Norte merece ser melhor tratado. Bateu-se contra o encerramento de parte da linha ferroviária do Douro e continua a dizer que esse erro tem de ser emendado, continuando-se a linha até Espanha. Foi pioneiro na defesa da navegabilidade do Douro. Continua a defender o incremento nas grandes infraestruturas do Norte, nomeadamente do porto de Leixões e do aeroporto de Pedras Rubras. Etc..., Etc..., Etc...Poderia ficar aqui muito tempo a relatar o pouco que sei do muito que tem feito este nosso concidadão. Vou pedir-lhes que me deixem relatar-lhes dois exemplos. Um deles contou-o na palestra que fez no nosso clube em Setembro de 1997. O outro faz parte dos que eu conheço. Vamos ao primeiro.No início dos anos oitenta foi o Sr. Engº Almeida e Sousa presidente da Assembleia Municipal do Porto. Um dia de Inverno à noite, saindo do Rivoli depois de uma sessão oficial , viu dois mendigos abrigados num portal da Rua Rodrigues Sampaio todos molhados e transidos de frio. Pensou o Engº Almeida e Sousa: Eu sou o presidente da Assembleia Municipal e como a Câmara está ali tão perto porque é que estes dois seres humanos não poderão estar lá abrigados? Não prejudicam nada pois todo o espaço está vazio a esta hora. Assim pensou e disse aos mendigos: venham comigo. Chegado à Câmara bateu à porta das traseiras e logo o porteiro reconhecendo-o lhe abriu a porta. Entra o Sr.Engº seguido pelos mendigos. Quando isto viu o porteiro logo expulsou todos não se importando que o Sr.Engº lhe dissesse que era o presidente da Assembleia Municipal e que tinha autoridade para entrar na Câmara com quem quisesse. Disse na reunião seguinte o Sr. Engº: Mas afinal o presidente da Assembleia Municipal que poder é que tem?Pergunto eu: Qual de nós seria capaz de tais atitudes ?O segundo exemplo: Noutro dia de inverno (o inverno agrava sempre tudo) às três horas da madrugada batem à porta da casa do Sr.Engº. Diz-lhe a esposa: Francisco não vás abrir que pode ser alguém com maus pensamentos. Resposta do Sr.Engº: Mulher, se alguém me bate à porta a esta hora é porque precisa de mim. E foi abrir. Era uma pobre mulher com a sua filha pequenina a pedir ajuda para o seu drama familiar. Ela sabia que às três horas da manhã o Sr. Engº lhe abriria a porta. Provávelmente a única porta da cidade aonde encontraria ajuda aquela hora.Pergunto eu: Qual de nós estaria disponível para ajudar uma pobre desconhecida às três horas da manhã? A resposta a esta pergunta foi dada pela pobre mãe: só o Sr. Engº Almeida e Sousa.Têm sido estas atitudes no campo social, político, profissional e económico, de desassombro, de verticalidade, de firmeza, de cabeça levantada, que fazem do Sr.Engº Almeida e Sousa um homem admirável mas, também, para quem exerce o poder , seja em que área for, um homem incómodo. E alguns responsáveis já mo têm dito, havendo quem gostasse que o Sr. Engº não entrasse nas áreas que lhes tocam. Mas ele entra porque tem uma integridade que não depende dos interesses em jogo. Aplica a prova quadrúpla em toda a extensão. É verdade? É justo? É ético? É benéfico ? Então vamos para a frente. Se incomodar que incomode. Enquanto não me demonstrarem que não tenho razão não me calam.Afonso Botelho no seu livro “Origem e Actualidade do Civismo” reflecte: “...A política actual dos povos europeus perdeu as categorias de pensamento do saber político e a noção da cidade clássica. O civismo, que ainda se pratica em alguns países, tem sua origem nas virtudes e hábitos do povo, quantas vezes, contrariados pelo sistema de governo e, de um modo geral, sem apoio nem estímulo deste.(...) Está fora de toda a realidade supor que se obedece ao povo exclusivamente porque se cumpre a sua vontade manifestada no sufrágio.(...) não se restabelece o civismo sem conhecer as grandes verdades que um povo vai exprimindo, quer imediatamente, quer através dos seus maiores pensadores, poetas, filosófos, músicos e artistas que pertencem, e na primeira linha, a esse mesmo povo.”O Sr. Engº Almeida e Sousa está nessa primeira linha de combate por uma elevada postura cívica.É assim que procede o Sr.Engº Almeida e Sousa.No Sábado passado, o jornalista Miguel Sousa Tavares escreveu, a respeito da atribuição do prémio Camões a sua mãe Sophia de Melo Breyner Andresen: “ A mim ela ensinou-me a olhar para as coisas e para as pessoas, ensinou-me a olhar para o tempo, para a noite, para as manhãs. Ensinou-me a abrir os olhos no mar, debaixo de água, para perceber a consistência das rochas, das algas, da areia, de cada gota de água. Ensinou-me a olhar longamente, eternamente, cada pedra da Piazza Navona em Roma, sentados num café, escutando o silêncio da passagem do tempo. Fez-me mergulhador e viajante, ensinou-me que só o olhar não mente e que todo o real é verdadeiro.”Também V.Exª. Sr. Engº Almeida e Sousa nos tem ensinado a olhar. Não só a olhar para o real, que é verdadeiro. Mas a olhar, também, para os seus sonhos, que transformamos nos nossos sonhos. Em Junho do ano passado o Sr. Engº usou a sua coluna no JN para nos transmitir um grande sonho.Ouçamos: (E passo a citar)“Também a mim me perguntaram o que é que eu esperava de o Porto vir a ser, em 2001, Capital da Cultura. Quem mo perguntou não foram certamente os jornais, nem foi a televisão, que não tenho categoria para isso, foram os meus garotos. De "motu proprio" também não acredito que tivesse sido, mas levados pelo que terão lido nos jornais, ou visto na televisão. A pergunta até ma fizeram correcta: o que é que eu esperava?A eles, por todas as razões, não nego resposta alguma, por difícil que possa ser. Muito menos as borilo ou escamoteio, que isso nem seria digno de mim nem eles mo aceitariam. É a verdade toda, tal como a penso. Para que eles se habituem a só aceitar a verdade. Por isso, aqui vai a minha verdade toda. Só que, vasta que teria que ser a resposta, já que grandes são os meus anseios, tive que a reduzir ao que me pareceu essencial. Disse-lhes que esperava muita coisa, muitas mais do que eles pensariam, mas que, de longe, o que mais me agradaria acontecesse, pois dependeria deles próprios. Porque o que mais quereria sem dúvida, mil vezes mais do que tudo o resto, é que a Cultura os impregnasse a eles e aos outros como eles, que fossem eles e os seus colegas os grandes beneficiários da Capital da Cultura que vem vir. Desculpem-me se não exponho aqui desígnios mais altos, mas esta é a minha verdade e o meu grande sonho.Afinal o que quero, ou o que sonho? Que eles, depois do evento, fiquem a saber mais, apreciem mais o que é belo, escalonem melhor os valores da sua vida. Que gostem mais de saber, que tenham interesses, no limite, que tudo os interesse _ é o meu grande e maior sonho, se quiserem, a minha maior utopia. Mas, que querem?, não desisto de queum dia venha a ser assim. Por que não quanto antes? Só por eles, acredito que não sejam capazes e nós devemos ter em conta que o não são. E não temos na nossa frente três anos para lho ensinar? Se o não conseguirmos, pois a responsabilidade não será deles, será nossa.Que querem?, não quereria que, depois de 2001, nenhum deles me voltasse a dizer de cima do ombro: "Não gosto da escola! Não quero ir mais à escola! Quero ir mas é trabalhar!" Quererá? E isto com incidência sobretudo na 5.ª ou 6.ª classes, 11, 12 ou 13 anos, quando quase não sabem o que é a escola. E menos ainda sabem o que é saber.Quanto a mim, desculpem-me opinião tão pessoal, é o grande desafio da nossa Cultura. Poderemos promover as manifestações mais assombrosas, grandes festas de Alta Cultura exigindo "smokings" e casacas, coisas maravilhosas de arte ou mesmo de ciência, tudo, poderemos embasbacar os mais altos estrangeiros que nos visitem, poderemos ir até ao fim seja no que for, que, se não conseguirmos que estes garotos, os portugueses de amanhã, tenham interesses, gostem de saber, apreciem o que é de apreciar, pois pobre Capital da Cultura que nunca passará de uma balofa estátua de Nabucodonosor, corpo belo e valioso, de ouro se for preciso, mas de pés de barro, sem consistência nem futuro, pronto tudo a cair por terra, ao pó que tudo esconde.É um pouco isto que, bem contrariado, aqui queria vir dizer. Vamos gastar muito dinheiro com certeza, e não serei eu que o chorarei, mas as migalhas, meus senhores, as migalhas pois que sirvam para modificar a visão de futuro que poderemos dar já nem diria à maioria, mas a esta parte significativa dos portugueses. Como? Pois essencialmente pensando neles. Pequenos que são, pensemos neles.” (Acabei de citar)Quem de nós, caros amigos, quer transformar em realidade este sonho do Engº Almeida e Sousa?Aprendamos a transformar os sonhos em realidade como ele o faz.Etienne de la Botie, poeta e filósofo francês do século XVI, refere no seu livro Discurso Sobre a Servidão Voluntária: Dignos de dó são aqueles que vivem com a canga no pescoço. Devem ser desculpados e perdoados, pois, nunca tendo visto sequer a sombra da liberdade e ninguém nunca lha tendo mostrado, não sabem como é mau serem escravos. Há países em que o sol aparece de modo diverso daquele a que estamos habituados: depois de brilhar durante seis meses seguidos, deixa-os ficar mergulhados na escuridão, nunca os visitando durante meio ano; se os que nasceram durante essa longa noite nunca tivessem ouvido falar do dia, seria de espantar que eles se habituassem à treva em que nasceram e nunca desejassem a luz?Sigamos o exemplo do Sr. Engº Almeida e Sousa de mostrar a luz a quem, por força do destino, vive nas trevas.Olhem para o Sr. Engº Almeida e Sousa. Vejam a sua grandeza, a sua verticalidade, a sua honradez, a sua fé e esperança em melhorar o mundo. Esta postura dá-lhe um grande crédito de felicidade.É que, meus caros amigos, a felicidade existe quando gostamos dos outros e os outros gostam de nós. E no Sr. Engº Almeida e Sousa há um capital de amor inesgotável.Costumo dizer que não há maior prazer do que o prazer de dar. E, também, digo que por pouco que se tenha deve chegar sempre para ajudar os outros. Aprendi isto com o exemplo do Sr. Engº Almeida e Sousa. Já uma vez tive ocasião de lhe manifestar a minha gratidão pessoalmente. E sabem como? Já lá vão quase dez anos e tinha iniciado o meu sonho profissional de dar continuidade à cerâmica tradicional de Porto-Gaia, criando a Cerâmica do Douro. Pois sabem a quem ofereci a primeira peça produzida, uma jarra conventual SPM (S.Pedro de Miragaia)? Pois ao Sr. Engº Almeida e Sousa: Fui à sua casa levá-la numa noite de Outono, há quase dez anos, em que o frio ia chegando mas em que era muito maior o calor do meu sentir de dar a quem o merece. Se outras razões não houvesse, esta exemplifica como me sinto honrado e contente por estar aqui neste momento .Sr. Engº Almeida e Sousa:Continue a incomodar-nos. Saiba que à segunda-feira no Jornal de Notícias tem muitas pessoas que querem aprender com o que nos ensina.Eu sei que nos vai dizer a seguir que não faz nada de mais e que não merece aquilo que lhe estamos a fazer.Não Sr. Engº. Nós é que não temos capacidade humana de poder dar-lhe tudo o que V.Exª e as suas obras merecem.Assim nós consigamos ser dignos de seguir o exemplo que nos dá. Mas acredite que olhando para o Mundo e vendo o muito que V.Exª faz para o melhorar e o pouco que conseguimos fazer, sinto um aperto no coração. Um aperto de angústia e até de desilusão. Um aperto que lembra os compromissos que temos para com os nossos irmãos da Terra. Penso que posso dizer isto em nome de todos.Continue a mostrar-nos os seus sonhos. Ensine-nos a sonhar. Pois como dizia António Gedeão.“ Eles não sabem, nem sonham,que o sonho comanda a vida.Que sempre que um homem sonhao mundo pula e avançacomo bola coloridaEntre as mãos de uma criança. “Muito obrigado
(Intervenção na homenagem promovida pelos rotários do Porto ao Engº Almeida e Sousa – Porto – 17/06/99)

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