segunda-feira, 23 de setembro de 2019

A Sociedade para uma Utopia Económica e Social


 “A Sociedade para uma Utopia Económica e Social”

O tema “A Sociedade para uma Utopia Económica e Social”, é de particular relevância e actualidade no momento histórico que atravessamos. Tal importância tem vindo a ser despoletada por vários ensaístas e filósofos, preocupados com o retrocesso humanista que as relações económicas e sociais têm vindo a sofrer, desde finais do século passado, começando a tornar utópica a Declaração Universal dos Direitos Humanos e os Pactos dela derivados, nomeadamente, para o tema deste artigo, o Pacto Internacional dos Direitos Económicos, Sociais e Culturais. Aquilo que a comunidade das nações, reunida sob a égide da Organização das Nações Unidas, quis tornar real há algumas dezenas de anos, está, agora, a ser considerado como uma irrealista utopia económica e social.
Ainda, recentemente, o Prof. António Rial Sanchez, da Universidade de Santiago de Compostela disse, em artigo publicado na revista [1] “Dirigir e Formar”, que “A sociedade foi, é e será sempre evolutiva e, em cada momento histórico, é necessário repensar a partir do presente, sem esquecer nem deixar de ter em conta o passado para poder construir o futuro. Acreditamos em algumas das premonições, como as que Aldous Huxley escreveu em 1931 no livro Admirável Mundo Novo, relativamente ao facto de as tecnologias poderem vir a condicionar as nossas vidas e melhorá-las, mas também sobre o prenúncio de que podem dar origem a uma sociedade de «castas», que é o que tem de ser evitado. É certo que Aldous o matiza, dizendo que isso apenas irá ocorrer se a sociedade, ou parte dela, mantiver o modo de pensar, que surgiu de correntes psicológicas clássicas imobilistas. Penso que hoje em dia a maioria dos cidadãos considera estas abordagens ultrapassadas, mas todos sabemos que «ainda resta alguma coisa» desses pensamentos e, se não estivermos atentos, podem voltar a rejuvenescer velhas perversões, embora prefira deixar este último ponto, apesar de o entender deste modo, à interpretação do leitor e à sua maneira de pensar.
O antídoto para isso é aspirar a ter uma sociedade que, em primeiro lugar, não se esqueça dos princípios humanistas. O ser humano reage tarde ou é facilmente enganado perante qualquer genialidade, quer seja tecnológica ou abstrata, como o podem ser, atualmente, conceitos manipulados num mundo de pós-verdades, como «o mercado », os «fundos abutres» ou outras genialidades, para as quais não faltam atores, em todas as classes sociais, trazendo, como consequência, decisões que favorecem uns para escravizar outros. Para lutar contra isto, a sociedade actual, e a que se aproxima, possuem recursos materiais, ferramentas e capital humano para reajustar os elementos essenciais, a formação, o trabalho digno, a investigação e a inovação, que têm de preconizar novas fórmulas e preparar-nos para uma nova sociedade, que está a surgir.
Encontramo-nos no limiar de um novo paradigma, cunhado por Klaus Schwab[2] como Quarta Revolução Industrial. É uma revolução «coperniciana» no que diz respeito aos outros mas com uma voracidade incalculável quanto às alterações que provoca, deixando muito pouca margem para erros quanto aos seus efeitos. Esta revolução é fruto da evolução tecnológica, gerada, em parte, pelas anteriores revoluções industriais, com o apoio da investigação, verdadeiro motor de mudanças e de efeitos que, até ao momento, eram pouco previsíveis e, atualmente, fazem, inclusive, com que existam tecnologias que estão ultrapassadas antes de serem colocadas em funcionamento. Aponta, e, de facto, assim está a acontecer, para alterações sustentadas na robótica, na inteligência artificial, na nanotecnologia, na biotecnologia, na computação quântica, na Internet das coisas, na impressão 3D, que dão lugar a uma segunda ou terceira era do maquinismo, que as torna inteligentes e com uma ampla margem de autonomia. Um reflexo anedótico desta revolução pode ser «um agricultor a tomar o pequeno-almoço no terraço enquanto o seu trator está a arar, a preparar e a semear o seu terreno».
O cenário é um mundo globalizado onde o trabalho é o meio para satisfazer as necessidades das pessoas. Atualmente, estas necessidades só são compreensíveis a partir do conceito do «trabalho digno», termo que a OIT cunhou e utiliza, principalmente desde o início deste século, para tentar alcançar este objetivo, mobilizando as envolventes do trabalho, procurando apoio e criando ferramentas, como a implementação da educação, da saúde, da igualdade de oportunidades, a eliminação da exclusão, a democratização, a personalização dos serviços e, de um modo geral em relação à formação, o aumento e generalização da formação básica e a continuidade da formação contínua... e, em relação ao trabalho, a «concretização desse trabalho digno (decente), tanto para o homem como para a mulher, remunerado em condições de liberdade, segurança e dignidade humana», lançando um desafio aos «políticos» para que deixem de tratar o emprego como um tema residual e coloquem o trabalho digno no centro da política.”
A invocação de Aldous Huxley e o seu “Admirável Mundo Novo” é oportuna e merecedora da reflexão. A reedição deste livro pela “Antígona” em 2013 (a primeira publicação data de 1932, tendo sido escrito em 1931), refere, na dobra da capa, a apreciação do autor, pouco antes da sua morte em 1963, de que o livro[3] “…é uma parábola fantástica sobre a desumanização dos seres humanos. Na utopia negativa descrita no livro, o Homem foi subjugado pelas suas invenções.
A ciência, a tecnologia, e a organização social deixaram de estar ao serviço do Homem; tornaram-se os seus amos. Desde a publicação deste livro, o mundo rumou a passos tão largos na direcção errada, que, se eu escrevesse hoje a mesma obra, a acção não distanciaria seiscentos anos do presente, mas somente duzentos. O preço da liberdade, e até da simples humanidade, é a vigilância eterna.”
Se Aldous Huxley fosse vivo, hoje diria que a parábola que escreveu, prevista para a sociedade do ano de 2540, está a concretizar-se na actualidade. Isto mostra a velocidade a que estão a acontecer as mudanças sociais, antecipando, no tempo, visões de futuros, ainda recentemente, parecendo longínquos.
Sobre os novos tempos que se avizinham, retomemos o Prof. António Rial Sanchez, quando constata: “Estamos a iniciar a Revolução 4.0, que representa uma mudança exponencial em relação ao que a Terceira Revolução Industrial nos concedeu, dado que aproveita a totalidade da sociedade do conhecimento.
A OIT faz uma retrospetiva dos seus 100 anos e uma previsão dos novos cenários que se presume irão exigir novas formas de trabalhar e as medidas que têm de ser adotadas para mitigar os seus efeitos no «trabalho digno».
Estes novos desafios vêm juntar-se aos já existentes e ameaçam agravá-los (OIT 2018). Até 2030 é preciso criar 344 milhões de empregos, além dos 190 milhões de empregos que são necessários para pôr fim ao desemprego atual, ou seja, um total de 534 milhões de novos empregos.
Outros problemas que os Estados têm de solucionar de imediato em muitos países é o acesso aos meios digitais. Apenas 53,6% dos lares têm acesso à Internet. Nos países emergentes, a percentagem é de apenas 15%. É necessário corrigir muitos desajustes e abusos que estão a ocorrer. (…)
Estabelecer uma Garantia Laboral Universal que proporcione uma base de proteção social para todos os trabalhadores, designadamente direitos fundamentais dos trabalhadores, organização e limite do tempo de trabalho, apesar de ser um feito alcançado na Segunda Revolução Industrial tem permanecido esquecido. Assegurar a representação coletiva dos trabalhadores e empregadores através do diálogo social, promovido através de políticas públicas. Potenciar e gerir a tecnologia a favor do trabalho digno e adotar uma abordagem da inteligência artificial baseada no controlo humano. Aumentar o investimento no trabalho digno e sustentável. Criar incentivos para promover investimentos em áreas-chave para o trabalho digno e sustentável. Rever as estruturas de incentivos às empresas a favor de abordagens de investimento de mais longo prazo na economia real e explorar indicadores adicionais de desenvolvimento humano e bem-estar.”
Tendo as previsões e propostas da OIT sido elaboradas no ano passado, já olhamos para elas como utópicas e ultrapassadas pela realidade vigente. Basta atentar na situação, dos professores contratados em Portugal, que, mesmo com mais de 20 anos consecutivos de serviço, em múltiplas escolas e com horários frequentemente incompletos, continuam precários, com o salário de início de carreira, violando o princípio, comparativamente com os professores efectivos, de para trabalho igual, salário igual. 
Desde há alguns anos tenho vindo a reflectir e a escrever sobre o desfasamento entre o consignado nos grandes referenciais políticos económicos e sociais (utopias?) e a evolução da realidade, constatando que não é cómodo, para mim, viver com muitas das facetas que hoje caracterizam o mundo. Atualizando o que tenho dito, nos mais de 70 anos que levo de vida, sinto que se assiste a uma dinâmica de retrocesso naquilo que de mais importante existe nas relações entre pessoas: uma cultura humanista de liberdade, de tolerância, de fraternidade e de paz.
Há um retrocesso numa cultura de liberdade já que as formas de intimidação e repressão são cada vez mais assustadoras, impondo às pessoas uma postura de medo e cobardia inibidoras duma vivência em liberdade. Quem se assume livremente quando a necessidade de ganhar dinheiro obriga à aceitação de salários e condições de precariedade próximas dos regimes de escravatura? Quem se assume livre perante a vigilância a que se é sujeito nas mais variadas formas e pelas mais diversas entidades?
Há um retrocesso numa cultura de tolerância já que se assiste a uma não aceitação do outro com a sua identidade que deve ser respeitada. Veja-se o que se passa com a dificuldade da integração dos jovens em que a escola e a entrada no mundo do trabalho são cada vez mais obstáculos de monta, não reconhecendo às crianças e aos jovens que são portadores de grandes valias a quem os adultos devem abrir portas e não criar problemas acrescidos.
Há um retrocesso numa cultura de fraternidade com exemplos bem patentes no vergonhoso desastre humanitário dos refugiados e no fosso escandaloso entre pobres e ricos, provocando situações de marginalidade e exclusão social indignas duma sociedade humana. Isto potencia a criminalidade social o que leva à destruição da estrutura familiar e às prisões (instituições medievais impróprias duma sociedade do século XXI).
Há um retrocesso numa cultura de paz já que se há característica bem marcante dos dias de hoje é a agressividade entre as pessoas, entre as instituições e entre os Estados. São cada vez mais os desajustamentos familiares com os divórcios consequentes (processos dolorosos nomeadamente quando os filhos inocentes são os que mais sofrem), são cada vez mais os processos judiciais com as penhoras e execuções sempre lamentáveis, são cada vez mais insultuosas as trocas de “piropos” entre os partidos políticos (que deviam ser a fonte do exemplo), existindo espalhadas pelo mundo guerras e conflitos entre Estados e organizações que provocam vítimas e ódios difíceis de esquecer (Afeganistão; Iraque; Síria, Congo; País Basco/Catalunha; Palestina; etc…). Há um crescendo de formas de exercício do poder político que se assumem autoritárias, prepotentes, nepotistas, cleptocratas e fomentadoras do ódio e da discriminação (USA, Brasil, Filipinas, Arábia Saudita, Itália, Rússia, Hungria, China, Líbia, Coreia do Norte, etc…).
Como não me revejo neste estado do mundo só me resta deixar este testemunho às minhas filhas, aos meus netos e a todos os jovens de que isto que se está passar, e que os afecta gravemente, não tem o meu acordo. Não em meu nome!
Na construção desta sociedade perversa, assustadoramente, assistimos neste início dum novo século a novas e preocupantes facetas nas relações entre os cidadãos e entre estes e a organização social, parecendo que se está a construir um novo modelo ao arrepio daquilo que era apontado como os melhores suportes da estrutura social. 
Mas é inquestionável que a solidez de todas as construções está intrinsecamente ligada à boa resistência e harmonia dos seus pilares, nos quais se apoia a malha envolvente que explicita a estética idealizada. Sem pilares sólidos toda a construção é vulnerável, tornando-se efémera e de pouca confiança.
Assim, também, se passa na construção das relações humanas que, para ser sólida e harmoniosa, necessita de pilares consistentes e bem construídos, desempenhando papel mestre os pilares da ética e da cidadania.
Para a sua execução é imprescindível que todos os obreiros sejam exímios nos domínios do bem, de que se destacam a verdade, a honra, a vergonha, o brio, a solidariedade e a tolerância. Sem a observância destes domínios, a construção das relações humanas não resistirá à mais pequena brisa.
A sua concepção e manutenção têm de integrar a força, a beleza e a sabedoria, colunas mestras, estas, sempre necessárias a toda a obra que aspira à perfeição. A força da vontade, a beleza dos olhos nos olhos e a sabedoria do conhecimento certo.
A ética e a cidadania são pilares em que tem de assentar toda a construção das relações humanas, sendo obrigatório que a liberdade, a igualdade e a fraternidade, sejam o cimento que os solidifica. A liberdade do respeito pela diferença, sem imposições do lobby e da ditadura da maioria ou da sabotagem da minoria; a igualdade tal como ela é proclamada no artº 1º da Declaração Universal dos Direitos Humanos “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos”; a fraternidade da partilha, bem expressa no lema “Por pouco que se tenha deve chegar sempre para ajudar os outros”.
Todavia, outros materiais tentadores e, porventura, mais fáceis, são colocados à nossa disposição: a inveja, a vingança, a ingratidão, o egoísmo, a intolerância, a demagogia, a ambição desmedida, o ódio, etc..., são elementos que poderão edificar ilusoriamente uma construção faustosa mas que ruirá, mais tarde ou mais cedo, deixando a quem nela se abrigou o relento da frustração, se ainda não tiver sido bloqueado o domínio do seu livre pensamento.
E quando isto acontece, quando a consciência fica obliterada, quando a escuridão ameaça tapar a luz, meditemos no que disse o poeta e filósofo francês do século XVI, Etienne de la Botie,[4]: “Dignos de dó são aqueles que vivem com a canga no pescoço. Devem ser desculpados e perdoados, pois, nunca tendo visto sequer a sombra da liberdade e ninguém nunca lha tendo mostrado, não sabem como é mau serem escravos. Há países em que o sol aparece de modo diverso daquele a que estamos habituados: depois de brilhar durante seis meses seguidos, deixa-os ficar mergulhados na escuridão, nunca os visitando durante meio ano; se os que nasceram durante essa longa noite nunca tivessem ouvido falar do dia, seria de espantar que eles se habituassem à treva em que nasceram e nunca desejassem a luz?”
Etienne de la Botie viveu numa época em que a escravatura era assumida como realidade social, sendo os escravos uma mais valia a quem os seus “senhores” proporcionavam condições de alojamento, saúde e alimentação para permitir disporem de mão de obra para os trabalhos necessários. A escravatura moderna do século XXI desonerou os “senhores” da necessidade de sustento dos seus escravos, pagando-lhes, apenas, salários exíguos, em situações instáveis e de precariedade, e os novos escravos que tratem dos meios para viverem. Há escravos a competirem por condições de sobrevivência, em quantidade suficiente, que permitem o funcionamento da economia sem grandes compromissos dos seus “senhores” e da nova burguesia de serventuários medianamente remunerados.
Relativamente à perda de controle que os seres humanos estão a ter na sua vida, o escritor contemporâneo Amin Maalouf[5], em entrevista ao jornal Público de 20/07/2019, declarou: “Estas tecnologias que tanto nos dão no domínio do conhecimento e da comunicação, estão a fazer-nos derrapar cada vez mais para o controlo por causa do medo. Um controlo que pode tornar-se incontrolável: podemos ouvir tudo, o que toda a gente diz, escreveu, para onde vai. Estamos num mundo em que as tecnologias colidem cada vez mais com as liberdades e, ainda por cima, concordamos com isso.”….” Mas a dado momento será preciso pensar num sistema que possa fazer ao conjunto da população que é parte envolvida no progresso. Desde há 40 anos, temos tendência a aceitar que alguns possam tornar-se muito ricos e os outros que se safem. É um quadro perigoso. Em França tivemos um alerta com os coletes amarelos. Não sei em que momento poderá degenerar. Sente-se um mal-estar e isso poderá revelar-se explosivo.”
Este mal estar é patente em todos aqueles que, ainda, resistem em pensar “fora da caixa”, em terem pensamento próprio. O jornal de expressão anarquista “A Batalha”[6] conclama, na sua edição de Mai/Jun 2019, com um artigo “Abandonai os vossos cartazes” em que termina: “ (…) Não vai haver mudanças vindas de cima. Devemos parar de pedir aos nossos governantes que façam o oposto dos seus interesses – devemos, isso sim, vencer quem nos domina e os seus interesses. (…)
Chegamos à destruição irreversível dos espaços poéticos.(…)”
Resta a questão: Como construir uma sociedade que integre uma utopia económica e social? Vivemos tempos que apelam às utopias ou estamos perante distopias? Como encarar o número cada vez maior de personalidades relevantes, de vários quadrantes políticos, que assumem estarmos perante uma distopia com uma dinâmica de opressão, assustadora e totalitária?
Como ligar este processo em curso com “O Processo” de Franz Kafka, de há um século?
Desde há mais de dois séculos que os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade fizeram parte da utopia desejada, com solidez filosófica e construção prática em crescendo. Tais valores começaram a ser questionados a partir de finais do século passado, assistindo-se, hoje, a um recuo na sua vivência, podendo-se constatar que as grandes causas estão a ser postas em causa, de que a escravatura moderna é um exemplo. A Paz, a Liberdade, a Justiça, a Dignidade, a Solidariedade, a Educação, A Moral, a Ética, o Amor, a Fé, etc..., sendo pilares necessários à solidez das relações humanas, correm o risco de se desagregarem, já que assistimos, com justificações em que se encontra ausente a sensatez e a sabedoria, à tentativa da sua subalternização por pseudovalores que se querem colocar acima do Homem, quando deveriam estar ao serviço do Homem. Os direitos básicos de dignidade humana como a saúde, a alimentação, a educação, a habitação, o trabalho digno, a justiça, o usufruto de serviços públicos essenciais, etc…, estão em regressão, sendo substituídos por bens sujeitos às leis do mercado, deixando de fora quem não dispõe de poder económico para a eles aceder.
A manipulação através dos órgãos de comunicação social está a atingir níveis tais como os que George Orwell descreveu no seu livro 1984 e nos deixou em antevisão (escrito há 70 anos), já que os seres humanos têm cada vez menos controle sobre as suas competências emocionais. Os grandes referenciais de vivência da Humanidade, nomeadamente os construídos na segunda metade do século XX, que incluem os da economia e da sociologia, estão-se a tornar-se utopias cada vez mais distantes, parecendo que a sociedade está a desistir da sua defesa e aprofundamento.
É urgente a construção duma nova ordem política, económica, social e cultural.
Tempos difíceis se avizinham.  


Manuel Hipólito Almeida dos Santos



Referências bibliográficas:
Botie, Etienne de la – “Discurso Sobre a Servidão Voluntária”
Huxley, A. – “Admirável Mundo Novo”- Ed. Antígona [2013]
Kafka, Franz – “O Processo”
Orwell, George – “1984”
Pimprenelle – jornal “A Batalha” [Mai/Jul 2019]
Rial Sanchez, A. - “O Futuro do Trabalho” -  revista “Dirigir e Formar”, - [Jul/Set 2019]
Santos, M. Almeida dos – “Questões de Ética e Cidadania” [2000]
Santos, M. Almeida dos – “ONG’s Passado e Presente – Uma experiência pessoal” [2014]
Schwab, K., - “Fórum Económico Mundial 2016”

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RESUMO
A felicidade, enquanto utopia objectivamente indefinida, tem sido uma desejada constante de referência na vida de todos os seres humanos. Como todas as utopias, a sua construção permanente assenta numa multiplicidade de factores, de que os económicos e sociais são parcela relevante, com uma flutuação evolutiva inconstante de que a história nos dá o seu registo. Neste início de século XXI estamos a assistir a uma regressão nos caminhos para a utopia da felicidade, nomeadamente nos económicos e sociais, com uma passividade espantosa daqueles que mais são atingidos.



[1] Rial Sanchez, A. – “O Futuro do Trabalho” -  revista “Dirigir e Formar”, - [ Jul/Set 2019]
[2] Schwab, K., - “Fórum Económico Mundial 2016”
[3] Huxley, A. – “Admirável Mundo Novo”- Ed. Antígona [2013]
[4] Botie, Etienne de la   - “Discurso Sobre a Servidão Voluntária”
[5] Maalouf, A., - “jornal Público de 20/07/2019”
[6] Pimprenelle – jornal “A Batalha” – Mai/Jul 2019

sábado, 7 de setembro de 2019

Drogas: Principal contribuinte da população prisional


Drogas: Principal contribuinte da população prisional


O Papa Francisco tem, desde o início do seu pontificado, dedicado particular atenção às prisões, visitando-as frequentemente e manifestando preocupação com as suas consequências no presente e futuro dos reclusos, assim como nas suas famílias, apelando aos Estados para a sua humanização e construção de políticas que visem a prevenção da criminalidade que leva às prisões.
A experiência da O.V.A.R. (Obra Vicentina de Auxílio aos Reclusos) nos contactos com os reclusos leva-nos à consideração de que as drogas são, actualmente, a principal responsável pela maioria dos crimes punidos com penas de privação da liberdade, já que além dos crimes específicos de tráfico de drogas e posse de quantidades superiores às referidas legalmente, muitos dos crimes contra as pessoas, contra o património e contra a vida em sociedade são vias para arranjar dinheiro para o negócio das drogas.     
Esta constatação leva-nos a que tenhamos a opinião de que as drogas são mais um problema se saúde pública do que penitenciário, corroborando semelhantes opiniões de altos responsáveis políticos, entre os quais o atual Diretor Geral da Reinserção e Serviços Prisionais, Dr. Rómulo Mateus.
Iguais considerações temos vindo a produzir em eventos relevantes, nomeadamente nas sessões de homenagem de que fomos alvo na Assembleia da República (Prémio Direitos Humanos 2018) e no Terra Justa 2019 – Causas e Valores da Humanidade. Ainda no passado mês de Julho, em audição parlamentar na Assembleia da República, voltamos a dar ênfase a este tema, tendo dito “(…) Com este quadro aterrador é urgente uma mudança profunda, com o entendimento sobre a prevenção da criminalidade como caminho para a abolição das prisões, invertendo a tendência para aumentar o leque de casos e comportamentos humanos classificados como crimes puníveis com penas de privação da liberdade. Como exemplo, podemos atentar na problemática das drogas, que estimo em ser responsável por mais de 80% dos crimes cometidos pelos reclusos em cumprimento de pena, tendo sido condenadas, em 2018, cerca de 8.000 pessoas por questões relacionadas com drogas, além das que foram condenadas por crimes contra as pessoas, contra o património e contra a propriedade que, na maioria dos casos, se destina a obter meios que permitam o acesso às drogas. Tenhamos em consideração que, ainda em meados do século passado, era inexistente, ou quase residual, a sua figuração nos normativos penais. E atente-se nos exemplos que recomendamos aos nossos alunos de figuras famosas da literatura, das artes plásticas, da música e do desporto, que reconhecemos como personalidades relevantes, apesar de terem tido comportamentos e contactos com drogas que, hoje, são puníveis pela comunidade. Além da cegueira que é a não criminalização, com perda da liberdade, do consumo de drogas, não querendo ver que aceitando o consumo tem de se aceitar a sua produção e comercialização. Logo, há que considerar uma nova política de drogas, enquadrando legalmente a sua existência, desde a produção ao consumo, simultaneamente com uma grande campanha de sensibilização para os efeitos das dependências e suas consequências, a exemplo
do que já foi, e está a ser, feito para o tabaco e para o álcool. Os meios humanos e financeiros adstritos ao combate às drogas, desde as polícias às prisões e às instituições cujo modelo de negócio assenta nesta problemática da droga e seu tratamento, possibilitam a feitura dessa grande campanha de sensibilização (…).”
As prisões e as razões que levam a penas de privação da liberdade, são matéria que deve preocupar todas as pessoas sensíveis às tentações, ao perdão e à misericórdia. S. Vicente de Paulo foi uma dessas pessoas sensíveis, como podemos constatar no excerto do livro “ Vicente de Paulo – Pai dos Pobres – Edições Paulinas – 2006”: Já em 1618, S. Vicente de Paulo tinha visitado as obscuras prisões da Conciergerie onde estavam encerrados, em condições desumanas, centenas de condenados. (…). Era um espectáculo desolador nunca visto até então.(…) Os condenados viviam num verdadeiro inferno, blasfemavam contra Deus, amaldiçoavam a vida e gritavam sem esperança de serem atendidos. (…). Não podendo acabar com esta forma de escravatura, S. Vivente de Paulo desenvolveu uma série de iniciativas no intuito de melhorar as condições de vida destes homens. (…).
           
Manuel Hipólito Almeida dos Santos
Presidente da O.V.A.R.