quinta-feira, 21 de julho de 2011

Situação dalguns dos direitos humanos das crianças

Seminário Internacional sobre os Direitos das Crianças

Os Direitos das Crianças na Actualidade - Porto, 19 de Novembro de 2011

Memorando

1 – A Situação no Mundo

1.1 – Quadro geral

Todos os dias, crianças de todo o mundo são vítimas de abusos dos direitos humanos. As crianças são vítimas de escravatura, de guerras, prostituição, pornografia, actividades ilícitas e são expostas a trabalhos perigosos como o das minas, manuseamento de máquinas agrícolas, produtos químicos, pesticidas, etc… . O clima social na escola e na sociedade não tem sofrido as correcções necessárias de forma a proporcionar às crianças as condições de desenvolvimento que são apontadas pelos instrumentos internacionais vigentes.
Estima-se que 218 milhões de crianças entre os 5-17 anos trabalham, excluindo o trabalho doméstico. Todos os anos, 1,2 milhões de crianças são traficadas, 5,7 milhões são utilizadas para escravatura, 1,8 milhões são forçadas a prostituir-se, 300.000 crianças participam em conflitos armados e 600.000 estão ligadas a actividades ilícitas.
Os números são alarmantes e demonstram, ainda, o longo caminho a percorrer pelas autoridades no estabelecimento de leis e no cumprimento destas, para que cada vez menos crianças sejam vítimas destes abusos.
Os diferentes instrumentos jurídicos de direito internacional, na sua quase totalidade ratificados por Portugal, tornando-o Estado-Parte, contêm provisões para o seu cumprimento.
É necessária a informação e consciencialização de que a concretização de uma "nova cultura" da infância e da criança, enquanto sujeito de direito, é um objectivo e responsabilidade de toda a comunidade.
A Amnistia Internacional apela para que a agenda política dos responsáveis governamentais coloque em lugar destacado o respeito e a promoção dos direitos humanos das crianças.


1.2 – Por que razão a desigualdade é importante – Relatório da UNICEF

A ideia de que a desigualdade se justifica enquanto reflexo de diferenças no mérito não pode razoavelmente ser aplicada a crianças. Poucos negarão que crescer em situação de pobreza aumenta consideravelmente o risco de vir a sofrer problemas de saúde, desenvolvimento cognitivo reduzido, baixo aproveitamento escolar, menos aptidões e aspirações, perpetuando a desvantagem duma geração para a seguinte.


1.3 – Castigos corporais sobre as crianças (Conselho da Europa – Comité Europeu dos Direitos Sociais)

O Comité não encontra razões para aceitar que a sociedade que proíbe qualquer forma de violência física sobre adultos permita que os adultos a apliquem a crianças. O Comité não considera que os castigos corporais tenham qualquer valor educativo e, por conseguinte, tal não pode ser justificado.
De acordo com o Relatório Mundial sobre a Violência nas Crianças, da ONU, somente 2,4% das crianças de todo o mundo estão legalmente protegidas de castigos corporais em quaisquer circunstâncias.


2 – A Situação em Portugal – Alguns indicadores
2.1 – A pobreza e a situação das crianças
Um estudo encomendado pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social divulgado no Dia Mundial da Criança em 2011, mostra que as crianças até aos 17 anos são o grupo mais vulnerável à pobreza, tendo ultrapassado o dos idosos.
É com base nesta abordagem que uma equipa de investigadores do Instituto Superior de Economia e Gestão, da Universidade Técnica de Lisboa, conclui que cerca de 40 por cento das crianças portuguesas vivem em "situação de pobreza".
Há grupos de crianças para quem os últimos anos foram particularmente pesados. Por exemplo: em 2004, das crianças que estavam inseridas em agregados onde ninguém trabalhava 39,7 por cento encontravam-se simultaneamente em privação e pobreza monetária; em 2009 a percentagem subiu para 45,3 por cento.
Neste período 2004/2009 os jovens à procura do 1º emprego ocupam o primeiro lugar como grupo mais vulnerável à pobreza, com valores da ordem dos 88% em 2008 e 88,6% em 2009.
De acordo com o relatório da UNICEF, Portugal é 2º país da OCDE (depois da Grécia) com maior desigualdade no bem estar material das crianças, em termos de rendimento, e é o país com maior taxa de pobreza infantil após transferências e impostos (rendimento disponível).


2.2 – As Crianças em Risco (Relatório 2010 das CPCJ)

De acordo com o relatório apresentado pela Comissão Nacional para a Protecção de Crianças e Jovens em Risco, no ano de 2010 foram acompanhadas 68.421 crianças pelas Comissões de Protecção de Crianças e Jovens, sendo de cerca de 40% os processos iniciados em 2010 e de cerca de 60% os transitados e reabertos.
Mais de 50% das crianças em acompanhamento já não viviam com o pai e a mãe (família biológica).
As principais situações de perigo foram a negligência, a exposição a modelos de comportamento desviante, os maus tratos psicológicos, o abandono escolar e os maus tratos físicos.


2.3 – Institucionalização de crianças

O Plano de Intervenção Imediato de 2009 do Ministério do Trabalho e Segurança Social documenta 9.563 crianças e jovens em acolhimento. Deve ter-se em conta que não são considerados neste valor as crianças e jovens que, não vivendo com os pais, vivem com familiares próximos sem terem recorrido a processo de institucionalização.
As famílias contratadas recebem € 172,41 mensais por cada criança que acolhem.

2.4 – Acidentes e violência com crianças

Foram documentadas mais de 13.000 crianças que presenciaram em 2010 actos de violência entre os pais, de acordo com estatísticas da APAV.
Vítimas de acidente ou violência morreram em 2010 em Portugal cerca de 300 crianças.


2.5 – Conflitualidade em meio escolar

De acordo com o Ministério da Educação, no ano lectivo 2009/2010 foram abertos 17.629 processos disciplinares, representando um aumento de 15,4% relativamente ao ano anterior.
O Observatório de Delinquência Juvenil da Universidade do Porto avaliou que metade dos jovens é vítima no meio escolar e que a maioria das agressões graves a menores é arquivada por desistência de queixa.


2.6 – As crianças e a expectativa do seu futuro

A OCDE no seu relatório anual de 2010 “Employment Outlook” refere que Portugal é o 4º país onde a precariedade mais atinge os jovens, destacando que nos países da OCDE dos jovens até aos 24 anos que têm trabalho mais de metade é precário.
Um estudo do Banco de Portugal em 2010 conclui que em cada dez empregos criados nove são precários e raras vezes se convertem em permanentes.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Lei contra a Precariedade

Tomei conhecimento de que se encontra a circular uma petição, a submeter à Assembleia da República como uma iniciativa legislativa de cidadãos, que se destina a combater a precariedade crescente nas relações de trabalho.
Na sua exposição de motivos, a petição inicia-se como um manifesto dos desempregados, “quinhentoseuristas” e outros mal remunerados, escravos disfarçados, subcontratados, contratados a prazo, falsos trabalhadores independentes, trabalhadores intermitentes, estagiários, bolseiro, trabalhadores-estudantes , estudantes, mães, pais e filhos de Portugal, reclamando uma mudança e um combate efectivo à precariedade.
É denunciado que “a precariedade atinge hoje cerca de 2 milhões de trabalhadores em Portugal e que o seu crescimento ameaça todos os outros trabalhadores, defraudando o presente, insultando o passando e hipotecando o futuro. Desperdiçam-se as aspirações de toda uma geração de novos trabalhadores, que não pode prosperar. Desperdiçam-se décadas de esforço, investimento e dedicação das gerações anteriores, também elas cada vez mais afectadas pelo desemprego e pela precariedade. Desperdiçam-se os recursos e competências, retiram-se esperanças e direitos e, portanto, uma perspectiva de futuro.”
A petição clama que “é necessária uma mudança qualitativa no país. É urgente terminar com a situação precária para a qual estão a ser arrastados os trabalhadores, que legitimamente aspiram a um futuro digno, com direitos em todas as áreas da vida.”
O objectivo da petição, disponível na Internet (www.leicontraaprecariedade.net), é que a Assembleia da República legisle no sentido de introduzir “mecanismos legais de modo a evitar a perpetuação das formas atípicas e injustas de trabalho, incidindo sobre três vectores fundamentais da degradação das relações laborais com prejuízo claro para o trabalhador: os falsos recibos verdes, a contratação a prazo e o trabalho temporário.”
Face à justeza da pretensão que esta petição encerra só se espera que os portugueses a subscrevam e que a Assembleia da República a torne lei, de forma a que nos sintamos dignos de viver num mundo civilizado, de respeito pela dignidade de todos os trabalhadores.

Sanguessugas

Uma sanguessuga é um anelídeo que se alimenta de sangue das suas vítimas, podendo ingerir uma quantidade de sangue 10 vezes superior ao seu próprio volume.
O Padre António Vieira nos seus sermões utilizava frequentemente uma linguagem figurada, em que se dirigia aos animais com o propósito de neles fazer figurar os homens (Sermão de S. António aos Peixes, por exemplo).
Nos tempos actuais apetece utilizar o mesmo estilo para caracterizar um comportamento de muitas pessoas que se assemelha à sanguessuga. Trata-se da forma vampiresca e parasitária com que muitos negociantes do sofrimento humano se atiram aos despojos das penhoras e leilões de bens de pessoas que se viram impossibilitadas de satisfazer os seus compromissos.
É revoltante o que se tem vindo a assistir e que a comunicação social dá conta. Face à crise económica e aos imprevistos com que muitas famílias são confrontadas, de que o desemprego involuntário é o flagelo mais visível, são frequentes os leilões em que casas, mobílias, livros, electrodomésticos, automóveis e todos os outros bens que fazem parte corrente da vida nos nossos dias, são postos à venda por valores que são um autêntico esbulho, sendo indiferente o sofrimento que se está a causar a quem ao longo do tempo foi estabelecendo relações de necessidade e afecto com os seus pertences. E é ver o contentamento das “sanguessugas” que se aproveitam dessas situações de aflição, exultando por terem feito um bom negócio comprando por tuta e meia aquilo que levou muito tempo a ser integrado no património das agora infelizes e desprezadas vítimas, que vêm fugir o que é seu sem que se lhes possa assacar culpa dolosa. Será que essas sanguessugas não têm noção do oportunismo parasitário do seu comportamento? Será que conseguem não pensar que os bens, que obtiveram por vias que se têm de classificar como não éticas, tiveram uma relação afectiva com os anteriores donos que deles se viram desapossados a muito custo? Quem consegue usufruir dum bem, sem preocupações de consciência, obtido à custa do sofrimento de outras pessoas? Só as sanguessugas. E não é que o Estado é um dos que participa nestes actos censuráveis, fazendo leilões de bens penhorados pelas finanças e pela segurança social, sem consideração pela situação aflitiva em que coloca as pessoas espoliadas dos seus bens?! Pobre Estado que nem é capaz de construir uma outra forma de resolver os conflitos gerados sem culpa das vítimas que não seja o esbulho e o saque.
Para que tais situações possam ter um tratamento que respeite os valores humanos que devem nortear a vida em sociedade, importa que as pessoas que ainda são possuidoras de sentimentos de solidariedade, caridade e amor ao próximo denunciem esses leilões, não participem neles, não comprem o que lá se quer vender ou vendeu e sensibilizem os que lhes estão próximos para a desumanidade subjacente a tal negócio.
A forma de ajudar quem está a passar por situações difíceis não é retirar-lhes os seus bens que lhes custou muito sangue, suor e lágrimas.
Num país que se diz cristão será que os portugueses pensam que Jesus Cristo abençoaria estes fazedores de negócios, estas sanguessugas?
Estamos a viver em tempo de trevas.

AMNISTIA INTERNACIONAL - 50º aniversário

Estava-se a entrar na década de sessenta do século XX e o advogado católico inglês Peter Benenson leu uma notícia de que em Portugal tinham sido presos dois estudantes por gritarem Viva a Liberdade (Como eu próprio testemunhei era-se preso pelas razões mais comezinhas). Este facto chocou Peter Benenson o que o levou a entrar na Igreja de S.Martin-in-the-Fields, em Londres, para reflectir sobre a melhor forma de ajudar pessoas que em todo o mundo eram perseguidas apenas por razões de consciência e decidiu fazer uma reunião com alguns amigos para o ajudarem neste propósito. Um desses amigos era director do jornal inglês "Observer" que disponibilizou toda a primeira página duma edição do jornal para uma notícia sobre o assunto. Tal publicação veio a acontecer no dia 28 de Maio de 1961 e essa 1ª página foi completamente preenchida com um artigo sobre os prisioneiros esquecidos. A notícia teve grande impacto mundial e deu origem ao nascimento duma organização que se chamou Amnesty International, tendo rapidamente criado secções nacionais em muitos países.
Em Portugal não foi logo possível criar uma secção nacional já que o regime político vigente não autorizava a constituição de associações desta natureza. Só após o 25 de Abril de 1974 foi possível desencadear o processo da criação duma secção portuguesa o que veio a acontecer a 18 de Maio de 1981 com o nome Amnistia Internacional.
Esta organização tem granjeado ao longo da sua vida o reconhecimento como organização séria, isenta, imparcial e independente dos poderes políticos e económicos. O seu trabalho em prol dos direitos humanos universalmente consagrados, quer sejam os de natureza civil e política, quer sejam os de natureza económica, social e cultural, a promoção e divulgação desses valores, assim como a defesa e ajuda às vítimas de violações de direitos humanos em todo o mundo, constituem um referencial humanitário de grande relevância, tendo-lhe já sido atribuído o Prémio Nobel da Paz em 1977, além de outros reconhecimentos nacionais e internacionais. O seu relatório anual, que sintetiza o panorama internacional sobre os direitos humanos, é sempre objecto de grandes referências na imprensa mundial e motivo de preocupações para os Governos já que têm de justificar as acusações de que são alvo.
Passados 50 anos da sua criação esta organização continua a ser necessária para que as pessoas saibam que ela vigia o cumprimento das obrigações do Estados sobre os direitos que temos e que têm de ser respeitados. A evolução de muitos aspectos da vida quotidiana traz novos riscos à observância dos direitos humanos. O crescente envolvimento de meios informáticos na vida das pessoas violando a sua intimidade e privacidade, o recurso a meios repressivos intoleráveis com o pretexto de combater o fenómeno da insegurança e da inobservância das leis, a pouca eficácia no combate à pobreza e exclusão social, são exemplos da actualidade no que diz respeito à necessidade do activismo de organizações com a A.I.
Neste mês em que se comemora o 50º aniversário da organização e o 30º aniversário da secção portuguesa, devemos congratularmo-nos com tais efemérides e associarmo-nos às acções que estão a ser levadas a efeito e que podem ser consultadas na sua página na Internet www.amnistia-internacional.pt.
Obrigado Peter Benenson (entretanto falecido) por há 50 anos ter sido sensível ao sofrimento de pessoas desconhecidas doutras partes do mundo e obrigado aos membros da secção portuguesa da Amnistia Internacional que há 30 anos fizeram com que Portugal passasse a contar com tal organização no seu seio.
Aos membros actuais fica a exortação de que temos de manter a chama viva.
Parabéns Amnistia Internacional.