quarta-feira, 20 de março de 2024

Povo português

 Agora é que se está a ver a verdadeira cerviz do povo português: inculto, servil, dissimulado, medroso, vingativo e manhoso.

A reverência ao padre e ao regedor sempre foram a sua matriz.

50 anos depois do 25 de Abril de 1974 o povo português voltou a mostrar a sua identidade.

Abstenção em Portugal – Razões Justificativas

 1 -  Caracterização do actual modelo de sociedade

                      - Grande complexidade da gestão política

                        - Quadro das relações público-privadas com muitas relações atípicas

                           (Ensino; Saúde; Economia/Finanças – ex: EDP; TLP; GALP; Banca, PPPs etc…).

                        - Interacção internacional múltipla (UE; OMC; CE; CLP; etc…).

                        - Referenciais internacionais imperativos (Directivas da U.E.; Convenções,  Tratados e

                               Protocolos da ONU e do Conselho da Europa; Acordos    bilaterais e multilaterais 

                               diversos – OMC; CLP; Países África/Caraíbas;  etc…).

- Mutações rápidas no conhecimento científico e nas TIC.


- Sentido pouco exemplar do Estado, dos seus dirigentes e das suas instituições 

       

  (O Estado não é considerado uma pessoa de bem).

 

2 – Caracterização da governação política

                      - Poder político assente em duas forças principais, com indefinições 

                          programáticas e acções casuísticas, com ausência de representação eleitoral;

                        - Actos eleitorais traduzidos em cheques em branco;

                        - Mutações frequentes nos quadros legislativos;

                        - As escolhas dos cidadãos baseiam-se, principalmente, no show-off, na

                            aparência fisionómica, na demagogia dos candidatos, no vedetismo

                          associado às forças políticas. Raramente no programa de candidatura;

                        - Os dirigentes políticos são cada vez mais boçais, incultos, oportunistas,

                          e com uma postura sem predicados éticos. Vulneráveis à corrupção,

                          compadrio, tráfico de influências e egoísmo, com pouca sensibilidade

                          real para com os mais desfavorecidos, revelam falta de idoneidade

                          pessoal ( negócios pouco claros, processos judiciais frequentes,

                       envolvimento em malabarismos económico-financeiros, etc…).

 

3 – Caracterização dalguns indicadores de cidadania

                      - Degradação da cultura cívica de ano para ano;

                        - Domínio da vacuidade nos espaços televisivos e de formação da opinião;

                        - Órgãos de comunicação social orientados pela rentabilidade económica;

                        - Fosso entre pobres e ricos agravando-se continuamente;

                        - Aumento da criminalidade em consequência da falta duma cultura

                          humanista e da falta de sentimentos de solidariedade e de partilha.

 

 4 - Assim sendo:

            - É preciso ser-se dotado de grande capacidade para escolher em quem votar,

               perante a complexidade deste sistema com ausência de responsabilidade dos eleitos;

            - Não há, no actual xadrez político, qualquer organização que tenha por objectivo

               a criação duma nova ordem política, económica, social e cultural.

            - Não faz sentido eleger pessoas para ficarem com privilégios inacessíveis a quem

               elege, determinando que o eleitor aceita o estatuto de inferior perante o eleito, 

              contrariando a orientação dos referenciais de direitos humanos de que todos

              somos iguais em dignidade e direitos (artº 1º da D.U.D.H).

 

Como considero que não sou nem mais nem menos que os outros, que não sou capaz de fazer opções

sérias neste sistema e nem vejo nele qualquer força política que se proponha modificá-lo,     

                                    

NÃO VOTO, ABSTENHO-ME!

 

Data: Finais do século XX e início do século XXI

domingo, 18 de fevereiro de 2024

A solidão e o abandono de pessoas - Criação de programa de combate

 

Petição pública

 

 

A solidão e o abandono de pessoas - Criação de programa de combate 

 

Constatando que:

 

- É cada vez maior o número de pessoas a viverem sós;

- A solidão e o abandono propiciam o aparecimento de doenças mentais;

- A depressão atinge, significamente, as pessoas que se encontram em ambiente de solidão ou abandono;

- A solidão e o abandono estão na base de muitos suicídios e de manifestações de desistência de vontade de viver;

- A solidão e o abandono são transversais a faixas etárias alargadas, desde os jovens aos idosos;

- A solidão propicia precipitadas ligações pessoais de afetividade precária e instável, com base no medo do sentimento de abandono;

- Os estudos sociológicos e clínicos demonstram um crescimento de patologias associadas à solidão e abandono;

- As famílias e a comunidade têm vindo a demonstrar um crescente alheamento das condições de vida das pessoas a quem as ligam laços de parentesco e amizade, aumentando a tendência para o crescimento da solidão e abandono;

- Há um crescimento preocupante de pessoas abandonadas nos hospitais e na situação de sem abrigo;

- As pessoas vivendo em ambiente de solidão e abandono tendem a restringir a sua adesão a realizações de valorização cultural e social;

- O abandono afetivo e a solidão, seja por ausência material ou de afeto negado, é uma violação dos direitos humanos pelo impacto direto e profundo na dignidade da pessoa humana;

- As medidas até agora tomadas têm-se revelado insuficientes para enfrentar as consequências da solidão e do abandono.

 

Considerando a responsabilidade que a todos incumbe nesta matéria, solicita-se à Assembleia da República a aprovação de uma lei quadro que consubstancie um conjunto de medidas de combate à solidão e abandono de pessoas, envolvendo e responsabilizando as famílias, a comunidade e as entidades especializadas relevantes nesta área.

Amnistia/Perdão de Penas no âmbito das Comemorações dos 50 anos do 25 de Abril

 

PETIÇÃO

Amnistia/Perdão de Penas no âmbito das Comemorações dos 50 anos do 25 de Abril

 

Destinatários da Petição:

Assembleia da República e Comissão Comemorativa dos 50 anos do 25 de Abril

 

É comummente aceite que o principal resultado da revolução do 25 de Abril de 1974 foi a conquista da liberdade pelos portugueses, de que todos nos orgulhamos. Por isso se designa o 25 de Abril como o Dia da Liberdade.

Infelizmente, nos anos posteriores a essa data, assistiu-se a um crescimento da população prisional que, certamente, não estava nos desígnios de quem no 25 de Abril de 1974 participou. Esta constatação do crescimento do número de reclusos está patente no facto de nessa data existirem nas prisões portuguesas menos de 3.000 reclusos, ao passo que, atualmente, temos mais de 12.000 pessoas nas prisões a que se adiciona cerca de 30.000 pessoas em cumprimento de penas e medidas na comunidade. 

Por outro lado, diversas instituições nacionais e internacionais, como a O.V.A.R. - Obra Vicentina de Auxílio aos Reclusos (Distinguida com o prémio "Direitos Humanos 2018" pela Assembleia da República), a APAR-Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso, o Conselho de Direitos Humanos da ONU, o Comité contra a Tortura do Conselho de Europa, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, o MNP da Provedoria de Justiça, etc..., têm vindo a denunciar e a condenar as condições desumanas existentes nas prisões em Portugal. Igualmente, tem sido denunciado que Portugal tem um excessivo tempo médio de cumprimento de pena (mais do triplo da média dos países da União Europeia), que a liberdade condicional raramente é concedida a meio da pena como está previsto legalmente e é prática corrente em muitos países europeus, que o quadro legal das penas sucessivas pode configurar a prisão perpétua proibida constitucionalmente, que a reinserção social dentro do sistema prisional é irrelevante, que devem ser alargadas as medidas alternativas  à pena de privação da liberdade, etc..., etc..., etc...

É também conhecido que a única amnistia aplicável ao sistema prisional, aprovada neste século XXI, relacionada com a visita do Papa em 2023 no âmbito da JMJ23, tendo sido muito restritiva e frouxa, não mostrou o registo de reincidência significativa nos reclusos abrangidos.      

Tendo em conta o exposto, e o significado da relação entre o 25 de Abril e a Liberdade, os signatários vêm solicitar que no programa das comemorações dos 50 anos do 25 de Abril conste a aprovação, pela Assembleia da República, de uma amnistia/perdão de penas, de aplicação ampla, de âmbito generalizado e de dimensão significativa.  

Nota. Esta petição será publicada na internet como Petição Pública, será enviada à Comissão Comemorativa dos 50 anos do 25 de Abril, ao Presidente da República, à Assembleia da República, aos partidos políticos com assento parlamentar na legislatura finda com a dissolução da AR, circulará nos estabelecimentos prisionais e será enviada aos órgãos de comunicação social.  Será, também, enviada à nova Assembleia da República logo que esteja constituída.

segunda-feira, 1 de janeiro de 2024

Eleições legislativas 2024 - Vinte questões relevantes

 Eleições legislativas 2024 - Vinte questões relevantes

- Há desinteresse, desencanto e descrença pelo atual modelo de sistema político, refletido no valor da abstenção (cerca de 50%), colocando em causa o seu caráter democrático, pelo que urge a sua alteração profunda, incluindo modificações à universalidade de voto nalgumas eleições;
- Os partidos políticos devem deixar de ter o monopólio da representação parlamentar, alargando-a a entidades relevantes transversais à sociedade. A classe política, assim como os partidos políticos, devem ter um estatuto semelhante a todos os outros cidadãos e associações, sem privilégios próprios;
- Deve ser implementado o princípio da subsidiariedade em todo o processo de gestão política, sendo de rever a perda de soberania com a adesão a organismos internacionais;
- O sistema fiscal deve ser profundamente revisto (por exemplo, libertando a tributação sobre o trabalho e onerando a tributação sobre o consumo não essencial), e os serviços públicos essenciais devem ter isenção de IVA;
- É necessária total transparência na gestão pública, devendo ser publicados, sem reserva, todos os contratos, relatórios e outros atos em que o Estado seja parte ou responsável;
- A paz social (versus conflitos, e sentimentos de ódio e vingança) deve ser um valor preponderante e os valores dos direitos humanos da liberdade, igualdade e fraternidade devem ser iguais, universais, indivisíveis, interrelacionados e interdependentes, com o aprofundamento das questões de ética e cidadania nos currículos escolares e na sociedade em geral;
- Deve ser reforçada a componente humanista no sistema educativo, tornando as escolas num espaço fraterno e atrativas para toda a comunidade escolar;
- É necessária uma política de fomento da produção nacional (vinho, fruta e outros produtos agrícolas, pesca, energias renováveis, ensino, turismo cultural, indústria (ex: cerâmica) e outras atividades de alto valor acrescentado) que permita uma economia sólida, amiga do ambiente e sustentável (A atual estrutura produtiva conduziu a valores em dívida de impostos e segurança social que ultrapassam os 30.000.000.000 de euros e a incentivos fiscais escandalosos);
- As exportações têm de assentar em produtos e serviços de alto valor acrescentado, substituindo a ilusão dos valores da Galp e da Auto-Europa que sendo as maiores exportadoras são também as maiores importadoras;
- A cessação de incentivos fiscais e subvenções a grandes grupos económicos tem de ser imediata, devendo ser proibida a cessão de créditos sem acordo das partes intervenientes nos contratos.
- O Estado deve ter presença ativa e reguladora em setores sensíveis da sociedade (banca, seguros, saúde, educação, cultura, energia, justiça, segurança, transportes e comunicações);
- O emprego deve ser estável e dignamente remunerado, acabando com a escravatura e a exploração (ex: precários, ubers, professores contratados, formadores, migrantes, operários, recurso a empresas de trabalho temporário, etc ...) e o salário mínimo nacional tem de se aproximar rapidamente da média da União Europeia;
- Tem de ser invertido o aumento significativo das desigualdades, da pobreza, exclusão social e pessoas sem abrigo, revendo o empenhamento social do Estado com programas concretos para a abolição de tais chagas sociais;
- Tem de ser revisto o modelo da gestão das delegações de competências do poder central e autárquico, nomeadamente nos apoios sociais, impedindo que se torne negócio;
- Deve ser fomentado, com urgência, o acesso à habitação, aumentando fortemente a oferta pública;
- Deve ser estudado o Rendimento Básico Incondicional;
- A justiça tem de ser humanizada (ex: visando a abolição das prisões), eliminando o seu pendor tecnocrático, priorizando a diminuição da conflituosidade, com a consequente diminuição das estruturas judiciais, policiais e prisionais e revisão profunda do código penal (tempo médio de cumprimento de pena, penas sucessivas e medidas de segurança), passando de um modelo de proibição, repressivo e punitivo, para um modelo preventivo e formativo, não privativo da liberdade, considerando como primordiais os pilares do perdão e da misericórdia. Deve ser tida em conta a equidade a par do direito, em todas as áreas da justiça;
- Deve ser implementado o direito à própria defesa consagrado no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, assim como a total aplicação da Convenção dos Direitos da Criança e todos os outros tratados e convenções de direitos humanos;
- A educação para a saúde deve ser um desígnio nacional, permitindo a automedicação, prevenindo, por exemplo, ações erradas como no enfrentamento da Covid19, incluindo a prevenção e tratamento de todas as dependências (ex: drogas) com auxílio e informação, sem punição e com enquadramento legal de todas as substâncias e práticas que provocam dependências;
- É necessária uma cultura efetiva dos direitos humanos consagrados na Declaração Universal dos Direitos Humanos.

domingo, 17 de dezembro de 2023

# Mudar Porto.6 – Refletir com o passado – Caminhar para o futuro

 # Mudar Porto.6 – Refletir com o passado – Caminhar para o futuro

1 - Direitos Humanos – Dignidade de ser pessoa


2 - Celebra-se, amanhã 10 de Dezembro, a proclamação, há 75 anos, pela Organização da Nações Unidas, da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH).

Considerado o mais avançado referencial histórico para as relações entre as pessoas e a vida em sociedade, teve a sua origem como resposta à barbárie da II guerra mundial, para que não mais se repetissem as atrocidades cometidas, envolvendo na sua redação eminentes personalidades de profunda sensibilidade humanista.

E como estão a ser respeitados os princípios emanados dessa Declaração, neste final do ano de 2023?

3 - Passados 75 anos assiste-se a um esboroar dos princípios consignados na DUDH. As atrocidades da guerra que levou à construção da DUDH continuam espalhadas pelo mundo. O caso mais recente da Palestina é disso exemplo. Ódio, vingança, violência, abuso da superioridade bélica, desumanidade, passividade e conivência de muitos responsáveis políticos e de muita opinião pública pelo sofrimento dos povos. As vítimas do passado tornam-se, muitas vezes, os carrascos do presente.

4 - E temos, no presente, a situação na Palestina, na Ucrânia, no Iémen, no Curdistão, no Sara Ocidental, em Myanmar, na Síria, etc…, etc…, etc… . Em todos estes conflitos a DUDH está ausente. Os Estados representados na ONU que estão obrigados a respeitar aquilo a que se comprometeram, fazem disso letra morta, alimentando as máquinas de guerra causadoras de morte e sofrimento. Ainda recentemente, uma revista de economia aconselhava os investidores a aplicações financeiras em fundos de que fazem parte empresas de armamento. E os cidadãos mais abastados, cegos por ganharem mais euros para as férias de fim de ano ou para trocar de automóvel, dão instruções aos seus gestores da conta bancária para tais aplicações, sem consideração pela responsabilidade que assumem nas violações de direitos humanos que essas empresas de armas de guerra provocam e apoiando governos que pactuam com essas violações de direitos humanos.

5 - E que dizer do agravamento das desigualdades, do elevado nível de pobreza, dos sem abrigo, dos refugiados e migrantes, das novas formas de escravatura, da situação nas prisões,  etc…, etc…, etc… .

Passados 75 anos da proclamação da DUDH já quase ninguém fala nela. Têm visto alguma ênfase nas instituições políticas e nos órgãos de comunicação social perante uma efeméride – 75 anos - que tem, noutras situações, uma carga de grande simbolismo?

No mês passado estreou nos cinemas portugueses o último filme de Ken Loach com o título “The Old Oak”, no qual são retratados muitos dos problemas que afetam o mundo, em que é referida a expressão social bem conhecida: “Se os trabalhadores soubessem o poder que têm e o quisessem usar, então o mundo mudaria”. Quando será que os trabalhadores perdem o medo reclamando os direitos humanos, levantando-se com a tomada de consciência do seu poder e se unam para o utilizarem? 

Considerando os 23 anos deste século, assistimos a um retrocesso preocupante na observância do compromisso assumido há 75 anos.

6 - A jornalista Ana Sá Lopes no jornal Público de 29.10.2023 disse: “Já tinha havido a criminosa guerra do Iraque, as torturas de Guantánamo, a guerra do Afeganistão onde os Estados Unidos entregaram sem remorsos o poder aos taliban depois de todo o sangue derramado. O Ocidente tem um problema moral a resolver: a invocação permanente dos direitos humanos começa a ser conversa de chacha.”

Podemos aceitar que os direitos humanos sejam conversa de chacha? Podemos aceitar que esta sessão de Refletir com o Passado-Caminhar para o Futuro seja conversa de chacha? Podemos aceitar que os mais de 200 referenciais jurídicos das Nações Unidas derivados da DUDH sejam conversa de chacha? Podemos aceitar que os instrumentos de direito internacional humanitário sejam conversa de chacha?

7 - Podemos aceitar que a habitação pública em Portugal, que representa somente 2% do total de alojamentos, tenha objetivos muito longe da média da União Europeia que é superior a 14% com países a deterem valores da ordem dos 30 e 40%? Podemos aceitar que a renda média mensal de um T2 nesta cidade do Porto seja muito superior a € 1.000, valor inacessível a uma larga faixa da população? Podemos aceitar em Portugal um crescimento contínuo de pessoas sem abrigo, enquanto há 700.000 casas vazias? Podemos aceitar que as dificuldades económicas das pessoas levem às penhoras das suas casas, salários, pensões e aos despejos e à venda de crédito malparado a fundos abutre? Podemos aceitar que haja em Portugal mais de 4 milhões de trabalhadores e reformados a receberem menos de 800 euros mensais? Podemos aceitar que em Portugal haja mais de 70.000 jovens em acompanhamento nas CPCJs  e  mais de 3 milhões de diagnósticos de perturbações mentais em adultos e crianças? Podemos aceitar em ter uma situação nas prisões indigna e um elevado número de reclusos a quem são negados direitos elementares (Portugal tem o maior tempo médio de cumprimento de pena da União Europeia)? Podemos aceitar ter prisões opacas, medonhas, arcaicas, violentas, medievais, ineficazes, desumanas, violentas e dispendiosas? Podemos aceitar que o Governo cultive a opacidade e não divulgue os relatórios sobre o que se passa no interior das prisões que, nos últimos 50 anos, passou de 3.000 presos para mais de 12.000 e ainda mais de 30.000 em cumprimento de penas e medidas na comunidade? Podemos aceitar que a chaga social das dependências não tenha uma outra visão humanista, promovendo a sua prevenção e o enquadramento legal dos seus fatores como se fez com o tabaco e o álcool, em substituição da repressão e punição? Podemos aceitar que a pobreza ocupe um espaço residual nos órgãos de comunicação social? Podemos aceitar que na era das tecnologias de informação e comunicação os sites das autarquias não contenham uma completa radiografia da sua situação económico-social?

8 - Se sim, se podemos aceitar, então aceitamos que vigore a lei do mais forte, do mais rico e do mais poderoso. Se sim, então aceitamos o regresso do poder das armas, do genocídio, da escravatura e de todos os modelos de exploração da pessoa humana. Se sim, aceitamos um modelo de sociedade desumana, policial, repressiva e punitiva. Se sim, aceitamos a opacidade e a lei da selva a nortear as relações entre as pessoas, o que se traduz num grave retrocesso civilizacional, tornando-se necessária uma nova ordem política, económica, social e cultural. Eu não estarei nessa corrente de aceitação. Eu estarei na corrente que Manuel Alegre nos deixou no poema “Trova do Vento que Passa”:

9 - “Mesmo na noite mais triste, em tempo de servidão, há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não.”.

Porto, 09/12/2023 

segunda-feira, 13 de novembro de 2023

“Sociedade, Justiça e Prisões em Democracia”

 

Observatório Permanente da Justiça

Ciclo de Encontros 

Sociedade, Justiça e Prisões em Democracia  08.11.2023


(Para ver os quadros completos clicar sobre o quadro)

. 

1- A Obra Vicentina de Auxílio os Reclusos - O.V.A.R.,  é uma obra especial ligada ao Conselho Central do Porto da Sociedade S. Vicente de Paulo, vocacionada para as visitas e coordenação do apoio aos reclusos e suas famílias, com atividade no interior das prisões

.
 A ação da O.V.A.R. é justificada pelo facto de ser reconhecida aos reclusos a necessidade de contacto com pessoas que os apoiem na sua vida pessoal e familiar e que lhes deem coragem e esperança para a integração na sociedade, libertando-os do estigma da prisão.                           .
                                 
A Assembleia da República distinguiu a O.V.A.R. com o prémio "Direitos Humanos” em 2018, pelo trabalho humanitário nos seus mais de 50 anos de voluntariado prisional.

 

2- A exposição e comentários que irei apresentar ligam-se aos poderes legislativo, executivo e judicial.

Tenho conhecimento do Plano Plurianual de Investimentos na Área da Justiça 2023-2027 e assisti à discussão, anteontem havida, do OGE 2024 na Assembleia da República, com intervenções da Ministra da Justiça e dos Secretários de Estado.

Cada prisão é uma realidade própria e distinta. Em cada prisão encontramos singularidades diversas. 

 

3 – População prisional em Portugal

      Em 31/12/1972  havia  3.405   reclusos em Portugal

      Em 31/12/1974          2.132                                       

      Em 31/12/1984          7.993                          

      Em 31/12/1994        10.035                          

      Em 31/12/2004        13.152                          

      Em 31/12/2014        14.003                           

      Em 01/11/2023        12.301                             (Covid19, JMJ23 e Lei de saúde mental, reduziram, recentemente, a população prisional em cerca de 2.500 reclusos)

      Acresce cerca de 30.000 em cumprimento de penas e medidas na comunidade

      .      Lotação máxima das 49 prisões – 12.663 reclusos

3 - Penas e medidas na comunidade por tipo de medida em Agosto 2022 –Total de pessoas - 29.668

 

 

4 - Penas e medidas na comunidade por tipo de crimes em 2021 –Total de pessoas – 30821

 

 

 

5 - DGRSP – Recursos humanos planeados para 2023



 

6 – Orçamento Geral do Estado para o Sistema Prisional



 

7 – Exemplo do Volume II do relatório de atividades da DGRSP, que deixou de ser publicado a partir de 2011, o que impede de conhecer a realidade, em pormenor, existente em cada estabelecimento prisional( excerto)




 

8 – Situação prisional no mundo

- Em finais de 2021 havia mais de 10,7 milhões de pessoas presas em todo o mundo.

- Nos últimos 20 anos a população prisional no mundo cresceu cerca de 25%.

- Se diminuirmos o nº de reclusos deixará de ser tão premente o reforço de recursos humanos.

9 - Índice de reclusos nalguns países do mundo por 100.000 habitantes em 2021

      Estados Unidos da América ………….…….…………………. 630

      Brasil …………………………………………………………….. 380

      Rússia ………………………………………….……….………... 360

      Africa do Sul…………………………………………………….  250

      Portugal …………………………………………………………  120

      China ………………………………………..………………..,,,.   120

      Japão ….……………………………………..…………………..    40

      India ……………………………………………….…………. ..     30

      Média da Europa Ocidental …………………………………...   70

 

10 –Relatório da Provedoria de Justiça 2022 - Mecanismo Nacional de Prevenção

 

            O MNP tem apontado anualmente (pág. 33 de 133 páginas):

     (i)        -    a desatualização de grande parte do edificado, a sua diversidade e assimetria,

  (ii)          -  as frequentes situações de sobrelotação e  ocupação excessiva dos alojamentos,

(iii)       -  as carências de recursos humanos e de meios materiais, que prejudicam, em várias dimensões, as condições da vida em reclusão.

 

  Em face do exposto, o MNP reitera a necessidade de se adotarem medidas para fazer cessar:

      o reiterado incumprimento pelo Estado Português das condições mínimas para um alojamento digno de pessoas reclusas, que se manifesta:

      (i) na sobrelotação de mais de metade dos EP,

       (ii) no caracter coletivo da maioria dos alojamentos e

      (iii) nas reduzidas áreas de alojamento por recluso, inferiores as orientações internacionais do CPT e do TEDH.

      A este respeito, o MNP relembra e acompanha o apelo do SPT  (Subcomité para a Prevenção da tortura da ONU) ao Governo Português, no sentido de ser ampliado o uso de medidas alternativas à detenção.

      A par da falta de oportunidades laborais, o MNP constatou, com apreensão, que a remuneração auferida pelos reclusos se mantem significativamente inferior ao standard praticado no exterior, existindo também uma grande disparidade entre o vencimento dos reclusos, consoante o trabalho seja prestado para o próprio EP ou para uma entidade externa.

       O MNP ouviu várias queixas quanto a ausência de um rendimento digno, facto que impossibilita aos reclusos o aforro de quantias para a própria subsistência no regresso a liberdade. Exemplo disto e o EP de Tires, onde o MNP recebeu relatos de reclusas que auferem aproximadamente 70 euros mensais, apesar de prestarem seis horas diárias de trabalho para uma empresa externa.

 

11 – Condições nas Prisões

- Estimo que em Portugal cerca de 60% dos crimes praticados pelos homens e  80% dos praticados pelas mulheres estão ligados à droga, cujo tráfico continua dentro das prisões.

- Grande parte dos reclusos são toxicodependentes e consome drogas na prisão.

A Taxa de suicídios nas prisões é das mais elevadas da Europa . Em apenas três dias dois reclusos perderam a vida por suicídio no Estabelecimento Prisional de Vale de Judeus, no concelho de Azambuja. O primeiro foi Paulo Anjos, de 34 anos, que pôs termo à própria vida a 7 de Outubro e o segundo caso, ocorrido a 10 de Outubro, envolveu um homem estrangeiro, de 42 anos. Num outro estabelecimento prisional, na Izeda, um outro recluso suicidou-se no primeiro fim-de-semana de Outubro. O cenário negro levou a Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso (APAR) a alertar para as “péssimas condições de vida dentro das cadeias” que “levam a que o número de suicídios seja dos mais elevados na Europa, para vergonha de todos”.

 - Há uma grande opacidade sobre a vida no interior das prisões (ex: relatórios anuais de cada EP tal como foi feito até 2010). O Estabelecimento Prisional de Monsanto, por ex:, tem sido objeto de queixas frequentes.

 

 

12 – O Trabalho nas Prisões 

O trabalho nas prisões é pago, na generalidade,  a menos de €1,00/ hora

A maioria dos reclusos não têm trabalho regular e a maioria dos que trabalham só o fazem poucas horas por dia.

Não se conhecem os protocolos com as entidades que utilizam trabalho dos reclusos.

 

13 – Aspetos da Situação em Portugal

 - O tempo médio de cumprimento de pena dos reclusos portugueses é mais do que o triplo da média da União Europeia.

- As penas sucessivas podem levar a que reclusos cumpram mais de 25 anos consecutivos de prisão.

- Recentemente a Lei da Saúde Mental acabou com a prorrogação sucessiva das medidas de segurança que poderia levar à prisão perpétua.

 

14– Direitos Humanos nas Prisões

- O Estado de Direito fica à porta das prisões.

- Não há o direito à própria defesa previsto no PIDCP.

- As condições de vida são infra-humanas, apesar da melhoria recente na alimentação

- O quotidiano é de grande agressividade. Há alegações de tráfico de drogas, chantagem sobre as famílias, violência frequente, agressões sexuais e um clima de sofrimento para todos (reclusos, guardas prisionais e funcionários).

- Não há a divulgação dos relatórios individuais de cada E.P. tal como era feito até 2010.

- As Regras de Bangkok continuam ausentes do ordenamento jurídico português

- As prisões são instituições medonhas, arcaicas, medievais, ineficazes, violentas,  desumanas e dispendiosas.

- Há um deficiente apoio para a reinserção social.

- Os cuidados de saúde têm fortes restrições (ex:próteses).

- Há alegações de carência de bens básicos (papel higiénico, dentífricos, etc).

- A atuação do TEP arbitrária e inconsistente.

- Há sobrelotação em muitas prisões.

- Existem graves lacunas nas ações de educação e formação.

- Há dificuldade no prosseguimento de estudos. Acesso a meios informáticos está impedido.

- Há debilidade no apoio psicológico.

 

 

 

15 – Situação das crianças e Jovens em Portugal

 

- Temos mais de 70.000 crianças por ano em acompanhamento  nas CPCJs. 
- Há cerca de 900 crianças e jovens nos Centros Tutelares Educativos e estabelecimentos prisionais.
- Há cerca de 10.000 crianças e jovens em acolhimento.
- Temos milhares de processos disciplinares nas escolas.
- Uma em cada três crianças vive numa família com  rendimentos abaixo
   do limiar da pobreza e necessita  de  apoio da Ação  Social  Escolar.

 

16 – Opacidade e mistificação nas prisões portuguesas

 

A O.V.A.R. tem vindo a denunciar a não divulgação de relatórios do Conselho da Europa e da sua divulgação automática, dos estabelecimentos prisionais, dos protocolos com empresas que utilizam mão de obra prisional e sobre o direito à própria defesa, entre outras situações, sem que se assista à correção dos procedimentos indevidos.

 

17– A Assembleia da República e os estabelecimentos prisionais 

 

- Na anterior legislatura foi constituída uma Sub-Comissão para a Reinserção Social e os  Assuntos Prisionais dentro da CACDLG DA A.R.. Foram efetuadas audições de múltiplas entidades. Com a dissolução da AR o trabalho havido não teve consequências.

- Em 28.11.2022 foi aprovado, por unanimidade, na nova Sub-Comissão, a audição, novamente, de algumas dessas entidades, entre as quais a O.V.A.R.. Como os deputados mudaram na quase totalidade na Sub-Comissão, voltamos à estaca zero. Desconhecem-se os resultados dessas audições.

- Algumas forças políticas não apresentam iniciativas de benefício do sistema prisional pois temem consequências eleitorais desfavoráveis. 

 

18 – Declarações de personalidades ligadas ao sistema prisional

- O sistema penitenciário clássico falhou os seus propósitos - Dr. Alberto Costa Ex-Ministro da Justiça.

- Se o inferno existe ele está nas prisões – Dr. Alberto Martins - ex-Ministro da Justiça.

- As prisões são um absurdo. Um absurdo, por enquanto necessário, mas um absurdo. E só numa lógica de absurdo, já ela uma aparente contradição, é possível entendê-las e aceitá-las. - Dr. Álvaro Laborinho Lúcio – Ex-Ministro da Justiça e Juiz Conselheiro.

- A experiência dos últimos 200 anos tem sido um fracasso. (…)  A prisão não reinsere; por vezes fomenta a própria criminalidade.  Dr. Germano Marques da Silva - Professor de Direito Penal.

 - A cadeia é um lugar injusto. (….) Parte de um tipo de Estado que, com ela, busca fins de repressão e submissão (…) A cadeia tal como a conhecemos não foi inventada para curar ou reabilitar (…).  Pe. António Correia - Capelão Prisional do EPPF.

- “O condenado que entra numa penitenciária é como uma mercadoria que se arrecada num armazém e, pouco a pouco, vai entrando no abismo dos malditos, dos ex-homens, com os seus conflitos e farrapos de tragédia (…) 

Emídio Santana - Político, Ensaísta e ex-Recluso

- A Associação Sindical de Chefias do Corpo da Guarda Prisional (ASCCGP) alerta que se “avizinha o descalabro” nas cadeias e que não serão os “números de ilusionismo do Ministério da Justiça” a resolver os “indícios alarmantes, indesejáveis e perigosos” que já perturbam o sistema prisional. Num comunicado emitido nesta quarta-feira, 25/10/2023, os chefes da Guarda Prisional referem que estão cada vez mais céticos e já não acreditam em “melhorias” que evitem o “caminhar para um colapso sistémico” do sistema prisional.

 

19 – Necessidade de um novo paradigma

- O Pilar Social como eixo da sociedade.

- Subordinação da economia ao equilíbrio social.

- Afirmação dos valores de ética e cidadania.

- Prevenção de conflitos em vez de repressão.

- Cultura dos valores de liberdade, igualdade, fraternidade, paz, e tolerância, em substituição do ódio, vingança, egoísmo, violência e insensibilidade.

- A vivência dentro das prisões ´é geradora de sentimentos de frustração, desânimo e revolta, tendo em conta estarmos em presença de situações cruéis, desumanas e degradantes, sem que se vislumbre sentido útil na finalidade da sua existência, quer para os reclusos, quer para quem lá trabalha. As prisões são fonte de conflitos sociais e familiares, envolvendo reclusos e funcionários prisionais.

- As prisões não ressocializam nem promovem a paz social. Somente alimentam o desejo de vingança das vítimas e dalguma opinião pública, não tendo efeito relevante no ressarcimento dos danos dos crimes. Além de que promovem o sensacionalismo primitivista que alimenta certos órgãos de comunicação social.

A convicção de que essa desumanidade, provocadora de penas e tratamentos cruéis, desumanos e degradantes, proibidas por tratados e convenções internacionais, não pode continuar a existir nem é passível de correção, aliada à ineficácia e fracasso do modelo penitenciário existente no mundo ocidental há pouco mais de 200 anos, não tem outro caminho que não seja a sua abolição..

As prisões são instituições cruéis, assustadoras, anacrónicas, medievais, medonhas, arcaicas, degradantes, ineficazes, violentas, desumanas e dispendiosas.

Tal constatação é reforçada pelo contributo retirado das bases filosóficas das maiores religiões professadas no mundo, que assentam nos pilares do perdão e da misericórdia e não na vingança, tendo em conta a imperfeição do ser humano e a sua condição de potencial pecador....

A alternativa passa pela assunção da prevenção da prática de atos anti-sociais como a via exclusiva e prioritária a implementar, complementada com o novo modelo de justiça preventiva/restaurativa que tem vindo a ser instaurado em vários países, deixando de se aplicar penas de privação da liberdade, abolindo-se as prisões.

 

20 - Por um Mundo Sem Cárceres - Pastoral Carcerária do Brasil

Um mundo sem cárceres não é utopia. Utopia é acreditar que encarcerar resolve os conflitos sociais. A Prisão é uma máquina de destruir pessoas, mata a dignidade, afeta sonhos e fomenta ódio, rancor e desejo de vingança.

      Agosto 2021

 

 21 – Exemplo de opacidade nas prisões – Programa “Fechado” da RTP 2 - 2023

 


 

 22 – AVANÇOS CIVILIZACIONAIS

 Nos séculos XIX  e XX assistiu-se à aprovação de tratados e convenções abolindo a escravatura e a pena de morte. Não foi um caminho fácil.

O século XXI tem de ser o da abolição das prisões.

          


  

Manuel Hipólito Almeida dos Santos

Presidente da O.V.A.R. – Obra Vicentina de Auxílio aos Reclusos