domingo, 24 de setembro de 2017

Equinócio de outono - 2017

Equinó 
Celebra-se, nestes dias, o equinócio de outono, caracterizado pelo facto de no hemisfério norte, em que nos situamos, a noite passar a predominar sobre o dia e muitas mudanças se processarem no ciclo da natureza, reflectindo-se no comportamento dos seres humanos.
Para se conhecer melhor o que é este equinócio devemos  atentar no simbolismo prático do Outono. O calor, a claridade e os sentimentos de verão, dão lugar à riqueza cromática que antecede a quelha das folhas, às temperaturas amenas que antecedem o frio e a uma maior tendência para a introspecção, preparando-nos para uma maior disponibilidade para o amadurecimento, seguindo o curso da natureza.
A Liberdade, a Igualdade e a Fraternidade, a cuja defesa estamos comprometidos, têm tido denúncias do seu atropelo, a que vamos ter de dar combate. Recentemente, o presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, juíz desembargador Orlando Nascimento, lembrou que a justiça, ela mesma, vai muito além da ação dos tribunais, lançando a questão: "Haverá alguma justiça numa sociedade em que todos os dias aumenta o número de pobres e em que os ricos são contemplados com volumosos subsídios, escondidos sob os mais variados pretextos, de investimento, de criação de emprego, de interioridade, de estímulo da economia?". Por sua vez, em artigo publicado na revista Dirigir e Formar do IEFP, o prof. Luís Capucha constata: “Não há progresso económico e social que possa deixar para trás os mais desfavorecidos. E como são acolhidos os mais desfavorecidos no sistema educativo, na justiça, no acesso aos serviços públicos essenciais, no emprego com remuneração digna?”. É de notar que cerca de 30% dos trabalhadores portugueses recebe menos de 600 euros mensais, que 80% dos pensionistas da segurança social têm reformas abaixo do salário mínimo nacional e que cerca de 50% dos portugueses não paga IRS devido ao seu baixo rendimento.
Considerando que vivemos um alegado período de saída da austeridade, devemos ter em conta que os pobres não beneficiam de reposição de rendimentos, pois como os que tinham eram míseros, não tiveram cortes com o complemento extraordinário de solidariedade, agravamento do IRS e congelamento de carreiras. Também não beneficiaram da descida do IVA de 23 para 11% na restauração pois não vão a restaurantes. Mas foram afectados pelo agravamento do IVA na electricidade e noutros bens essenciais, pelo agravamento do custo dos transportes públicos, pelo agravamento das taxas moderadoras na saúde (consultas e medicamentos), pela redução dos apoios sociais (RSI e subsídios pontuais), pelo agravamento das rendas, pela diminuição das esmolas fruto da contenção que a classe média se auto-impôs. Os mais desfavorecidos, incluindo as crianças com necessidades educativas especiais, não podem viver na solidão, no esquecimento, nem serem objecto de aumentos insultuosos de meia dúzia de euros por mês, não podem ser servos da escravatura moderna. 
Os conceitos da liberdade, igualdade e fraternidade têm de ser considerados de valor igual, universais, indivisíveis e interdependentes, pelo que aos mais desfavorecidos deve ser dada a prioridade para o acesso a condições de vida dignas.
Estas, e outras, considerações terão de ter, nesta passagem para o predomínio da escuridão sobre a luz, que nos vai acompanhar nos próximos seis meses, repercussão no nosso posicionamento. Temos de ter  a coragem de enfrentar o desafio que o filósofo contemporâneo, Michel Onfray, nos coloca quando diz: “O livre arbítrio é uma fábula que mascara o desconhecimento dos determinismos que nos programam. Nós, que nos cremos autónomos e portadores duma multiplicidade de coisas e de potencialidades, não fazemos mais de que obedecer.”
Estou certo que, independentemente do aumento da escuridão trazido pela passagem do equinócio do outono, saberemos, sempre, guiarmo-nos pela luz do oriente, que nos proporcionará a clarividência necessária à nossa acção de força, beleza e sabedoria.

22/07/2017