terça-feira, 20 de maio de 2008

Cerâmica do Douro - As Raízes Histórico-Culturais

Cerâmica do Douro - As raízes histórico-culturais

Perde-se na origem dos tempos o primeiro contacto entre o Homem e aquilo que hoje se designa por “Cerâmica”.A própria definição do que é um produto cerâmico (tudo o que resulta da transformação irreversível de matérias-primas naturais por acção do calor) evidencia, desde logo, que os elementos necessários à obtenção duma peça de cerâmica, como sejam os minerais e o fogo, coexistem com o Homem desde o seu aparecimento à face da Terra. Não é por acaso que em qualquer escavação arqueológica aparecem sempre fragmentos de peças cerâmicas, independentemente da época dos achados.Começaram por ser simples barros, tais quais se encontram na Natureza. O conhecimento das propriedades diferenciadas dos diversos barros fez evoluir o suporte matérico para uma mistura de barros, possibilitando a obtenção de peças com uma maior variedade de formas e de sentido estético. Nos séculos mais recentes, o conhecimento cientifico possibilitou um salto enorme na qualidade dos pro­dutos cerâmicos, já que da mistura de barros se saltou para a faiança, para o grés e para a porcelana. A par da evolução das formas foi-se, também, aprimorando o aspecto cromático. Aquilo que na Antiguidade eram desenhos simples, possibilitados pelo conhecimento técnico escasso, tornou-se hoje no principal elemento influenciador quando se aprecia uma peça cerâmica: a decoração. Constituídos, essencialmente, por óxidos metálicos, existentes nos minerais, as tintas e corantes, de que dispomos neste final do século XX, possibilitam já a obtenção de quase todo o espectro cromatológico, dando a uma peça cerâmica a beleza resultante da fusão dos seus dois elementos consti­tuintes: forma e decoração.Aquilo que no passado tinha uma função exclusivamente utilitária tem hoje um espaço que cobre praticamente todas as activi­dades humanas. Em Portugal, a tradição cerâmica encontra-se profundamente enraizada no passado. Os seus valores culturais, nas sua formas e decorações, encontram-se expressos nas peças produzidas nomeadamente nos séculos XVIII e XIX. Certo é que se tem assistido a um esbatimento da noção dessa importância, pelo que se exige o reavivar na memória colectiva dum património cuja preservação importa cultivar. Não o reavivar pela simples cópia, mas sim com o respeito pelos valores essenciais acrescidos dos novos valo­res que a todo o momento se vão impondo. A cultura não é só museológica, mas sim passado e presente.A região Porto - Gaia foi, até meados deste século, tradicionalmente rica em cerâmica doméstica e decorativa, tendo sido o rio Douro um importante apoio ao seu desenvolvimento.Bastará lembrar as fábricas de Massarelos, Miragaia, Cavaquinho, Santo António de Vale da Piedade, Devezas, etc......, que desde o século XVIII mantiveram lugar destacado e cimeiro na cerâmica decorativa portuguesa.Infelizmente, nenhuma destas unidades fabris sobreviveu, deixando em risco de extinção uma actividade de características culturais bem marcantes e enraizadas nas tradições e história desta região. A sua relevância mereceu a atenção de muitos estudiosos, de que o trabalho de Pedro Vitorino “Cerâmica Portuense”, publicado em 1930, merece particular destaque. Infelizmente, depois de 1930, raros são os trabalhos sistemáticos sobre a cerâmica desta região, sendo, todavia, de destacar algumas contribuições particulares que têm sido publicadas e que serão de grande utilidade para o estudo exaustivo deste sector de actividade.No entanto, a grande expressão, deixada sob diversos valores, permite dar continuidade a esta tradição, já que os valores estéticos subjacentes ao sector da cerâmica doméstica e decorativa (forma e decoração) são bem claros naquilo que se pode chamar valores identificativos: formas simples e funcionais decoradas com motivos expressivos que coabitam com grandes espaços nus.Importa, agora, reavivar na memória colectiva a noção da importância da cerâmica no contexto da região e do País. É que ainda há cem anos este sector de actividade, com mais de vinte fábricas de média e grande dimensão, representava a região como a mais importante do país.Em cem anos, não só se perdeu a noção da importância deste sector de actividade, com as suas características de marcado cunho histórico-cultural, a que artistas tão bem conhecidos como Teixeira Lopes e Soares dos Reis deram uma profunda colaboração, como se esbateu e quase desapareceu a continuidade duma tradição, mesmo na componente humana indispensável á sua continuação.A iniciativa agora existente, corporizada na “Cerâmica do Douro”, contem valores necessários ao reavivar das tradições cerâmicas da região.O cuidado na fidelidade à continuidade, pelo que pressupõe de actualização, tendo em conta os novos conhecimentos tecnológicos e a consideração dos valores culturais como dinâmicos, garante que, se a comunidade assumir as responsabilidades de apoio e acarinhamento, poderemos voltar a contar com uma riqueza de que a região se orgulha

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