terça-feira, 20 de maio de 2008

A Cerâmica do Douro na Cerâmica Tradicional

A Cerâmica do Douro na cerâmica tradicional

Tem-se vindo a assistir, como de uma fatalidade se tratasse, a um baixar de braços, ou a uma despreocupação involuntária negligente, perante o definhamento das actividades tradicionais, que se encontram em processo adiantado de agonia, tendo alguns dos seus membros já mesmo falecido.Esta referência às actividades tradicionais é no sentido de preservação e continuidade dum legado histórico, com profundo conteúdo cultural e, obrigatoriamente, com a mais elevada qualidade possível. Logo, não estão incluídas actividades desenvolvidas ao abrigo do chapéu do artesanato tradicional mas que são a perpetuação do artesão “pobre, sujo, roto e analfabeto”, ou o pretenso Kitsch, ou cópia mal feita, que parasita, de forma oportunista, o que de nobre há no conceito de actividades tradicionais.A agonia das actividades tradicionais recebe um forte contributo do crescente economicismo vigente no modelo político, económico, social e cultural, em que o factor preço se sobrepõe a critérios históricos, culturais e tradicionais, como, também, pela inexistência dum sentir forte de defesa de valores que não os de um utilitarismo falsamente barato.As tentativas de fazerem singrar na comunidade actividades que são os “Reflexos do Tempo” e que constituem um legado que temos de respeitar e valorizar, estão condicionadas pela sensibilidade dessa mesma comunidade a valores profundos que a identificam, assim como ao carácter efémero ou perene desse sentimento.A afirmação das actividades tradicionais vem a encontrar dificuldades acrescidas, pois a famigerada globalização tem imposto modelos de comportamento social, cultural e económico, que dificultam tudo aquilo que se afasta da padronização dominante. Sofia de Melo Breyner Andresen alerta-nos que “ A civilização em que estamos é tão errada que nela o pensamento se desligou da mão”.Importa, pois, que assumamos a responsabilidade de manter vivo, valorizando-o, o legado que nos foi deixado, respeitando o esforço dos nossos antepassados. A melhor homenagem que lhes podemos fazer é não deixar perecer aquilo que tão carinhosamente construíram.Vila Nova de Gaia foi o berço da cerâmica tradicional portuguesa, tendo Teixeira Lopes e Soares dos Reis dado um contributo relevante para tal. Ainda há cem anos, mais de duas dezenas de importantes fábricas davam à cerâmica tradicional um lugar de destaque na vida da região e do país.Importa que o futuro próximo passe pelo aumento de sensibilidade para com os valores culturais, históricos e tradicionais. As globalizações da economia e da sociedade não podem assentar sobre o caixão dos valores identificativos dos povos. A vivência das comunidades deve preservar as sua raízes, não se impondo nem esmagando os valores das outras comunidades. Deve ser estimulada a permuta mas nunca o derrube ou a aniquilação.O cuidado que ainda existe na fidelidade à continuidade das tradições cerâmicas, pelo que pressupõe de actualização, tendo em conta os novos conhecimentos tecnológicos e a consideração dos valores culturais como dinâmicos, garante que se a comunidade assumir as responsabilidades de apoio e acarinhamento, poderemos voltar a contar com uma riqueza de que a região se orgulha. A afirmação dos valores afectivos tem de vencer a enganosa sedução do mais barato, do incaracterístico, do que não presta.Que não se apague da memória colectiva a necessidade de preservação da cerâmica tradicional e de todas as actividades tradicionais cujos valores identificativos o justifiquem. A morte destas referências é , também, a morte de referências que são parte da nossa vida.Sigamos o que Alexandre O’Neil expressou no seu poema de grande profundidade:
E defendo-me da morte
Povoando de novos sonhos
A vida.

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